ROMENO ‘BAD LUCK BANGING OR LOONY PORN’ VENCE o URSO DE OURO em BERLIM

COMÉDIA ROMENA SOBRE PRÉ-JULGAMENTO CONQUISTA JÚRI COMPOSTO POR VENCEDORES ANTERIORES

Nesta primeira edição online do Festival de Berlim, tivemos apenas 15 filmes selecionados oficialmente (normalmente são cerca de 18) e o júri foi composto exclusivamente por vencedores do Urso de Ouro. O maior destaque da seleção havia sido o novo filme da diretora francesa Céline Sciamma (conhecida mundialmente por Retrato de uma Jovem em Chamas), Petite Maman, mas curiosamente foi um dos poucos filmes que saiu do evento sem nenhum prêmio.

Talvez o fato do festival alemão ter um histórico de filmes mais políticos ou politizados tenha desfavorecido Sciamma, mas felizmente o júri tinha bom humor para reconhecer uma comédia romena com o Urso de Ouro. Bad Luck Banging or Loony Porn (que poderia ser traduzido livremente como ‘Azar na Transa ou Pornografia Maluca’) acompanha a professora Emi, que tem sua vida e carreira ameaçadas após um vídeo de sexo ter vazado na internet. Apesar da forte pressão da escola e dos pais dos alunos, ela se recusa a se render.

Pra quem conhece ou já viu um dos filmes do diretor Radu Jude (aliás, ele ganhou o prêmio de Direção em 2015 por Aferim!, que é ótimo), sabe que ele tem um senso de humor incomum, sutil e sofisticado. O júri defendeu sua escolha dizendo que o filme tem “a rara e essencial qualidade de uma obra duradoura. Ele captura na tela o próprio conteúdo e essência, a mente e o corpo, os valores e a carne crua de nosso presente momento. Deste exato momento da existência humana”. Obviamente, não vi o filme, mas vendo o trailer, é possível dizer que se trata de uma sátira sobre esse julgamento moral existente em redes sociais e na opinião pública que pode facilmente destruir uma vida. Segue link abaixo para o trailer em inglês:

Considerado o 2º lugar, o Grande Prêmio do Júri foi para o filme japonês Wheel of Fortune and Fantasy (traduzindo livremente “A Roda da Fortuna e da Fantasia”), que narra três histórias sobre amor centradas em personagens femininas. Em 2018, Asako I e II foi um dos meus filmes favoritos, então tenho expectativas para este novo trabalho de Ryusuke Hamaguchi. Com histórias delicadas e bem humoradas, o diretor trabalha como poucos o lado singelo e lúdico que merece mais reconhecimento.

O cinema sul-coreano de Hong Sang-soo foi novamente premiado. Embora o autor tenha se tornado uma figura carimbada em festivais internacionais nos últimos anos, sempre tem batido na trave quando se trata de prêmio máximo. Já venceu prêmio de Direção em Berlim, Un Certain Regard em Cannes e indicado na mostra Horizontes em Veneza, mas ainda está faltando aquele prêmio para consagrar sua carreira. Nesta edição de Berlim, seu filme Introduction levou o prêmio de Melhor Roteiro sobre um homem que viaja para a Alemanha para surpreender sua namorada.

Fugindo da tradição, o festival alterou as categorias de atuação. Ao invés de premiar atuações masculinas e femininas, o reconhecimento foi para personagem primário e secundário. Maren Eggert foi eleita a Melhor Atriz ao interpretar uma cientista que se submete a um experimento de conviver por três semanas com um robô humanóide para obter fundos para sua pesquisa na comédia I’m Your Man. Já como Coadjuvante, a jovem Lilla Kizlinger foi reconhecida pelo filme Forest – I See You Everywhere.

Vale lembrar que a 71ª edição de Berlim ainda não acabou. Entre 09 e 20 de Junho, o evento será presencial com público, ainda respeitando as normas sanitárias da pandemia.

Confira todos os vencedores do Festival de Berlim:

URSO DE OURO
Bad Luck Banging or Loony Porn
Dir: Radu Jude

GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
Wheel of Fortune and Fantasy
Dir: Ryusuke Hamaguchi

PRÊMIO DO JÚRI
Mr Bachmann and His Class
Dir: Maria Speth

DIREÇÃO
Dénes Nagy (Natural Light)

ATUAÇÃO PRIMÁRIA
Maren Eggert (I’m Your Man)

ATUAÇÃO SECUNDÁRIA
Lilla Kizlinger (Forest – I See You Everywhere)

ROTEIRO
Hong Sangsoo (Introduction)

CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA
Yibrán Asuad pela montagem de A Cop Movie, de Alonso Ruizpalacios

MOSTRA PARALELA ENCONTROS

MELHOR FILME
We
Dir: Alice Diop

PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI
Taste
Dir: Lê Bảo

MELHOR DIREÇÃO
The Girl and the Spider
Dir: Ramon Zürcher, Silvan Zürcher


Social Hygiene
Dir: Denis Côté

MENÇÃO ESPECIAL
Rock Bottom Riser
Dir: Fern Silva

FESTIVAL DE BERLIM DIVULGA sua SELEÇÃO OFICIAL

Cena do filme Petite Maman, de Céline Sciamma.

EM SUA 1ª EDIÇÃO NA PANDEMIA, EVENTO ALEMÃO BUSCA ADAPTAÇÕES PARA NÃO SER CANCELADO

A 71ª edição do Festival de Berlim acaba de anunciar os filmes selecionados para competição oficial. Neste ano, a seleção foi mais enxuta com apenas 15 títulos (em 2020 foram 18), representando 16 países, e dentre eles 5 foram dirigidos por mulheres (alguns co-dirigidos).

“Se a Competição oferece um retrato do cinema de como é e como será, podemos dizer que a perturbação provocada pelos acontecimentos de 2020 levou os cineastas a aproveitarem o máximo dessa situação e a criarem filmes profundamente pessoais. Esta competição é menos rica em números, mas muito densa em conteúdo e estilo,” comentou o diretor artístico Carlo Chatrian.

Esta edição também será diferente devido à pandemia, pois será realizada em duas etapas. No início de Março, teremos a parte que envolve o Mercado Cinematográfico, no qual serão negociados os direitos de exibição entre as distribuidoras de forma online. Já entre 09 e 20 de Junho, ocorrerá o festival físico com público, mas ainda respeitando as normas sanitárias. “Queremos oferecer um gostinho das celebrações em Junho quando todos nós poderemos nos encontrar nos cinemas novamente,” defendeu a diretora executiva Mariette Rissenbeek.

E ao contrário das edições anteriores, o júri foi formado apenas por vencedores do Urso de Ouro recentemente. Ao todo são seis: o diretor iraniano Mohammad Rasoulof (There Is No Evil), a israelense Nadav Lapid (Sinônimos), a romena Adina Pintilie (Touch Me Not), o húngaro Ildikó Enyedi (On Body and Soul), o italiano Gianfranco Rosi (Fire at Sea) e a bósnia Jasmila Žbanić (Grbavica).

Da seleção, o novo filme da francesa Céline Sciamma, Petite Maman, é o que mais chama a atenção, já que ela ainda está muito em evidência depois do sucesso de Retrato de uma Jovem em Chamas, mas vale destacar também os novos trabalhos de Hong Sangsoo, Xavier Beauvois e a estreia na direção do ator alemão Daniel Brühl.

INDICADOS AO URSO DE OURO:

  • Albatros (Drift Away)
    Dir: Xavier Beauvois
    França
  • Babardeală cu buclucsau porno balamuc (Bad Luck Banging or Loony Porn)
    Dir: Radu Jude
    Romênia/Luxemburgo/Croácia/República Tcheca
  • Fabian oder Der Gang vor die Hunde (Fabian – Going to the Dogs)
    Dir: Dominik Graf
    Alemanha
  • Ghasideyeh gave sefid (Ballad of a White Cow)
    Dir: Behtash Sanaeeha, Maryam Moghaddam
    Irã/França
  • Guzen to sozo (Wheel of Fortune and Fantasy)
    Dir: Ryusuke Hamaguchi
    Japão
  • Herr Bachmann und seine Klasse (Mr Bachmann and His Class)
    Dir: Maria Speth
    Alemanha
  • Ich bin dein Mensch (I’m Your Man)
    Dir: Maria Schrader
    Alemanha
  • Inteurodeoksyeon (Introduction)
    Dir: Hong Sang-soo
    Coréia do Sul
  • Memory Box
    Dir: Joana Hadjithomas, Khalil Joreige
    França/Líbano/Canadá/Catar
  • Nebenan (Next Door)
    Dir: Daniel Brühl
    Alemanha
  • Petite Maman
    Dir: Céline Sciamma
    França
  • Ras vkhedavt, rodesac cas vukurebt? (What Do We See When We Look at the Sky?)
    Dir: Alexandre Koberidze
    Alemanha/Geórgia
  • Rengeteg – mindenhol látlak (Forest – I See You Everywhere)
    Dir: Bence Fliegauf
    Hungria
  • Természetes fény (Natural Light)
    Dir: Dénes Nagy
    Hungria/Letônia/França/Alemanha
  • Una Película de Policías (A Cop Movie)
    Dir: Alonso Ruizpalacios
    México

IRANIANO ‘THERE IS NO EVIL’ GANHA o URSO DE OURO em BERLIM

golden berlin bear

Equipe de There is No Evil segura coletivamente o Urso de Ouro em homenagem ao diretor Mohammad Rasoulof, impossibilitado de comparecer ao festival (pic by Teller Report)

FILME QUE CRITICA A PENA DE MORTE NO IRÃ É O GRANDE VENCEDOR

Neste sábado, dia 29/02, o presidente do júri Jeremy Irons revelou os vencedores da 70ª edição do festival alemão, anunciando a vitória do longa iraniano. There is no Evil, que apresenta quatro histórias, busca questionar a morte como forma de punição no país da Ásia. Curiosamente, o diretor Mohammad Rasoulof não pôde comparecer ao festival, pois seu passaporte fora confiscado pelas autoridades iranianas, que alega que o cineasta fazia propaganda contra o atual governo. Em 2017, seu filme A Man of Integrity (Um Homem de Integridade), que venceu o prêmio Un Certain Regard, criticava o sistema corrupto e injusto do Irã, já havia ocasionado um ano de detenção para o diretor.

Assim, a equipe e os atores do filme, incluindo a filha do diretor, Baran Rasoulof, subiram ao palco para receber o prêmio. “Obviamente estou muito feliz, mas ao mesmo tempo estou muito triste, porque este prêmio é para um diretor que não pôde estar aqui. E em nome da equipe, digo que isso (o prêmio) é dele”, disse a emocionada filha do diretor, que logo depois fez uma breve live com o pai pelo celular para que ele pudesse testemunhar à distância o público aplaudindo sua vitória.

Pra quem não conhece muito a história do festival alemão, Berlim tem uma tradição de premiar filmes mais controversos de cunho sócio-político. E nesse aspecto, podemos dizer que o júri acertou em cheio. Além do filme polêmico iraniano, o Grande Prêmio do Júri foi para o filme americano sobre aborto Never Rarely Sometimes Always. Com uma passagem marcante pelo último Festival de Sundance, o filme acompanha duas jovens amigas que juntam uma grana pra viajar para Nova York e realizar o aborto de uma delas. No palco, a diretora Eliza Hittman agradeceu aos médicos e às clínicas de aborto legalizadas nos EUA, que possibilitam essa liberdade feminina.

Para Direção, o júri selecionou o sul-coreano Hong Sang Soo por The Woman Who Ran. Pra quem conhece seus filmes, Soo costuma filmar suas personagens conversando sobre vários temas enquanto caminham, passando do trivial ao filosófico e ético. Mais uma vez, ele contou com sua atriz favorita Min-Hee Kim, que interpreta uma mulher casada há 5 anos que tem uma rara oportunidade de ficar desacompanhada e poder fazer uma avaliação de seu relacionamento com amigas.

Hong-Sangsoo-Eldiario.es

O diretor Hong Sang-Soo que venceu por The Woman Who Ran (pic by eldiario.es)

Pelas categorias de atuação, o italiano Elio Germano conquistou o prêmio de Melhor Ator por interpretar o pintor suíço Antonio Ligabue, que mesmo tendo passado boa parte da vida na Itália, sofrendo com problemas físicos e mentais, e internado em manicômios, almejava uma vida mais normal. A transformação do ator no filme Hidden Away (Volevo Nascondermi) conquistou o júri de forma unânime. Já a alemã Paula Beer levou Melhor Atriz por Undine, no qual sua personagem passional tem uma interação com uma entidade mitológica vingativa chamada Ondina.

1

Elio Germano no papel e recebendo o Urso de Prata

2

Paula Beer no filme Undine e com o Urso de Prata

Para Roteiro, os vencedores foram os irmãos italianos Fabio e Damiano D’Innocenzo, que em Favolacce, acompanham famílias dos subúrbios de Roma com uma pegada de fábula. Talvez tenha sido o prêmio mais questionado pela mídia internacional.

Este ano, o prêmio Alfred Bauer, que costuma reconhecer trabalhos mais inovadores, teve seu nome alterado para Prêmio da 70ª Edição de Berlim, pois recentemente descobriram que Bauer era um cineasta afiliado ao partido nazista! Sob o novo nome, o filme vencedor foi a comédia francesa Delete History, sobre uma família que busca se desvencilhar do vício das mídias sociais.

E o prêmio de contribuição artística foi para o diretor de fotografia Jürgen Jürges por DAU. Natasha, que é um projeto ousado que recria a União Soviética na era de Stalin em estúdio para que atores encenem a vida daquela época. Embora tenha sido premiado pela fotografia, o filme chama a atenção pelo sexo explícito e pela violência não-encenada. A mensagem do filme seria justamente criticar o excesso de autoridade de um diretor em um set de filmagem. Hello, Abdelatif Kechiche?

Embora o filme brasileiro Todos os Mortos não tenha levado nenhum prêmio, o Brasil esteve representado em co-produções vitoriosas como o colombiano Los Conductos, de Camilo Restrepo, que venceu o prêmio de Melhor Filme de Estreante.

Dentre as produções que saíram de mãos vazias está o novo trabalho de Kelly Reichardt, First Cow, assim como do ditetor malaio Tsai Ming-Liang, Days, que chegou a figurar como um dos favoritos a levar o Urso de Ouro até a reta final do festival.

Seguem os vencedores da 70ª edição do Festival de Berlim:

URSO DE OURO
There Is No Evil 
Dir: Mohammad Rasoulof

URSO DE PRATA GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
Never Rarely Sometimes Always

Dir: Eliza Hittman

URSO DE PRATA DE MELHOR DIRETOR
Hong Sang Soo (The Woman Who Ran)

URSO DE PRATA DE MELHOR ATRIZ
Paula Beer (Undine)

URSO DE PRATA DE MELHOR ATOR
Elio Germano (Hidden Away)

URSO DE PRATA DE MELHOR ROTEIRO
Bad Tales (Favolacce)
Dir: irmãos D’Innocenzo

URSO DE PRATA DA 70ª BERLINALE
Delete History

Dir: Benoît Delépine e Gustave Kervern

URSO DE PRATA DE CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA, FIGURINO OU DESIGN DE PRODUÇÃO
Jürgen Jürges (DAU. Natasha)

PRÊMIO DE DOCUMENTÁRIO
Irradiated

Dir: Rithy Panh

MELHOR FILME DE ESTREANTE
Los Conductos
Dir: Camilo Restrepo

URSO DE OURO DE MELHOR CURTA
T
Dir: Keisha Rae Witherspoon

URSO DE PRATA DE MELHOR CURTA PRÊMIO DO JÚRI
Filipiñana

Dir: Rafael Manuel

PRÊMIO AUDI DE CURTA
Genius Loci

Dir: Adrien Mérigeau

SEIS DIRETORAS DISPUTAM O URSO DE OURO no FESTIVAL DE BERLIM

First Cow

John Magaro em cena de First Cow, de Kelly Reichardt (pic by IMDb)

FESTIVAL QUE TEM HISTÓRICO SÓCIO-POLÍTICO APRESENTA MOMENTOS DE TENSÃO

A 70ª edição do Festival Internacional de Berlim começou no último dia 20 de Fevereiro sob inúmeros temas políticos, a começar pela substituição no comando do evento. Após quase 20 anos, o alemão Dieter Kosslick cedeu seu posto de diretor artístico do festival para o italiano Carlo Chatrian, enquanto a holandesa Mariette Rissenbeek se tornou a diretora executiva. Com essa alteração, já foi possível perceber um aumento de diretores desconhecidos, assim como de diretoras na disputa principal pelo Urso de Ouro.

Dos 18 filmes indicados, seis são dirigidos por mulheres: Sally Potter, Eliza Hittman, Kelly Reichardt, Natalia Meta, Stéphanie Chuat e Véronique Reymond (que dirigiram Schwesterlein), e  Jekaterina Oertel, que co-dirigiu DAU.Natasha.

The Roads not Taken

Javier Bardem e Elle Fanning em cena de The Roads Not Taken, de Sally Potter (pic by OutNow.CH)

Contudo, elas serão avaliadas por um júri presidido pelo ator britânico Jeremy Irons, que logo no início decidiu se explicar sobre seus comentários antigos de conteúdo machista e homofóbico resgatados em redes sociais. O ator disse ser a favor dos direitos femininos, que aprova casamento do mesmo sexo (desde que aprovado nas leis do país), e que seria a favor do aborto (se for a decisão da mulher). Não querendo ser advogado do diabo aqui, mas todos têm direito de errar e de se redimir, ainda mais por declarações antigas (vide as polêmicas de Twitter), já que todos amadurecemos, mas esperamos que suas opiniões pessoais não interfiram em suas decisões, apenas seu critério fílmico.

Jeremy Irons

O presidente do júri, o ator britânico Jeremy Irons, pronuncia-se sobre os temas polêmicos e pessoais (pic by Deadline)

Ainda sobre o júri, um dos integrantes é o cineasta brasileiro Kleber Mendonça Filho, diretor de Aquarius e Bacurau.  Na coletiva de imprensa, ele se demonstrou bastante preocupado com a situação delicada do Cinema Brasileiro. “Temos cerca de 600 projetos que estão atualmente congelados por causa da burocracia (do governo)”, disse Kleber.

Kleber

Em coletiva de imprensa, o diretor brasileiro Kleber Mendonça Filho expressa preocupação com o futuro do Cinema Brasileiro (pic by Folha de S. Paulo)

Da mesma forma preocupada, a produtora brasileira Sara Silveira, que estava na coletiva de imprensa do único filme brasileiro indicado ao Urso de Ouro, Todos os Mortos, dos diretores Marco Dutra e Caetano Gotardo, fez uma declaração sobre a censura do governo: “Eu não preciso de armas, eu preciso de força, de amor, de coragem e de momentos heróicos para suportar o que nós estamos vivendo. Mas aguardem, nós vamos resistir! Nós vamos vencer! Nós, todas as raças, todos os gêneros, os artistas, estamos juntos, todos estamos aqui gritando por liberdade, democracia, contra a censura e resistência!”. 

Infelizmente, com a ideologia do governo Bolsonaro, os cineastas brasileiros terão de ser ainda mais criativos para driblar os obstáculos para continuar fazendo filmes no país. Com a Ancine congelada, e o presidente nomeando uma pastora (!) para comandar a instituição da cultura, o Cinema Nacional corre sérios riscos de voltar aos anos 80.

Já sobre o filme Todos os Mortos, a estréia foi vista com frieza, inclusive com jornalistas abandonando a sessão. Embora filme se passe em 1899, dez anos após a abolição da escravidão, os personagens vivem na cidade de São Paulo atual, com intenção de demonstrar ao público que o comportamento racial de mais de 100 anos atrás persiste nos dias atuais. A perspectiva altamente brasileira porém não agradou o público internacional, e o jornalista Bruno Ghetti da Folha de S. Paulo cogitou como origem da recepção fraca o fato do foco narrativo pertencer aos personagens brancos, além dos dois diretores do filme serem brancos de classe média.

Mas voltando ao Festival de Berlim, logo no primeiro dia, houve um minuto de silêncio em homenagem às nove vítimas fatais de um atentado de cunho racista em Hanau, cidade bem próxima de Frankfurt.

Silence Minute

Da esquerda para a direita: o ator e host Samuel Finzi, a diretora executiva Mariette Rissenbeek e o diretor artístico Carlo Chatrian prestam homenagens às vítimas do atentado no primeiro dia do 70º Festival de Berlim (pic by china.org.ch)

Dentre os destaques deste ano, estão os novos filmes de: Abel Ferrara, Siberia, que seria descrito como uma exploração da linguagem dos sonhos; de Christian Petzold, Undine, uma história de amor e traição; e de Kelly Reichardt, First Cow, acompanha histórias de descobertas do oeste americano envolvendo a primeira vaca para contar sobre a origem do sonho Americano.

Vale destacar também a estréia internacional do drama Never Rarely Sometimes Always, que acompanha duas amigas da Pennsylvania que partem para Nova York em busca de ajuda médica para um aborto. No último festival de Sundance, o filme foi um dos maiores sucessos e ganhou um prêmio especial do júri.

Never Rarely

Sidney Flanigan em cena de Never Rarely Sometimes Always, de Eliza Hittman, que trata sobre o aborto nos EUA (pic by OutNow.CH)

O 70º Festival de Berlim termina no dia 1º de Março, quando os vencedores serão anunciados. Confira todos os 18 indicados ao Urso de Ouro, que já foi conquistado pelo Brasil em duas ocasiões: em 1998, com Central do Brasil, e em 2008, com Tropa de Elite.

INDICADOS AO URSO DE OURO 2020:

Berlin Alexanderplatz
Dir: Burhan Qurbani

DAU. Natasha
Dir: Ilya Khrzhanovskiy, Jekaterina Oertel

The Woman Who (Ran Domangchin yeoja)
Dir: Hong Sang-soo

Delete History (Effacer l’historique)
Dir: Benoît Delépine, Gustave Kervern

The Intruder (El prófugo)
Dir: Natalia Meta

Bad Tales (Favolacce)
Dir: Damiano & Fabio D’’Innocenzo

First Cow
Dir: Kelly Reichardt

Irradiated (Irradiés)
Dir: Rithy Panh

The Salt of Tears (Le sel des larmes)
Dir: Philippe Garrel

Never Rarely Sometimes Always
Dir: Eliza Hittman

Days (Rizi)
Dir: Tsai Ming-Liang

The Roads Not Taken
Dir: Sally Potter

My Little Sister (Schwesterlein)
Dir: Stéphanie Chuat, Véronique Reymond

There Is No Evil (Sheytan vojud nadarad)
Dir: Mohammad Rasoulof

Siberia
Dir: Abel Ferrara

All the Dead Ones (Todos os mortos)
Dir: Caetano Gotardo, Marco Dutra

Undine
Dir: Christian Petzold

Hidden Away (Volevo nascondermi)
Dir: Giorgio Diritti

 

FILME ROMENO de ESTREANTE, ‘TOUCH ME NOT’, VENCE o URSO DE OURO em BERLIM

adina-pintilie-festival-cinema-berlim-20180224-001-copy.jpg

A diretora romena Adina Pintilie posa com seu Urso de Ouro no Festival de Berlim (pic by Veja)

PRODUÇÃO ROMENA SOBRE INTIMIDADE E SEXUALIDADE BATE FAVORITOS

Considerado o mais político dos festivais de cinema, Berlim, em sua 68ª edição, buscou abraçar a causa feminista do #MeToo, lançado na época do Globo de Ouro. O presidente do júri, o cineasta alemão Tom Tykwer, premiou o filme que mais dialoga com o momento conturbado de assédios.

Touch Me Not, que em tradução livre significa Não Me Toque, é resultado de uma pesquisa feita pela diretora Adina Pintilie sobre as fobias e obsessões das pessoas em relação ao contato físico, tanto que possui uma mistura de linguagens de ficção e documental. Com um elenco composto por não-atores, a jovem diretora retrata cenas de nudez e masturbação e busca desafiar o público a entender esse comportamento do ser humano que é pouco discutido no cinema. Dos poucos e raros exemplares recentes que vi desse tópico foram os dois volumes de Ninfomaníaca, de Lars von Trier, mas de um ponto de vista mais patológico do que “normal”.

touch-me-not-5-aa910

Cena de Touch Me Not (Nu ma atinge-ma), de Adina Pintilie (pic by critic.de)

“O que o filme propõe é: abra-se para o diálogo que o mundo a sua volta está oferecendo”, declarou a diretora em seu discurso de agradecimento, quando levou todos os participantes do filme ao palco.

A produção romena da diretora estreante ganhou o principal prêmio da noite, batendo favoritos de diretores consagrados como o americano Gus Van Sant, que veio à Alemanha com o filme Don’t Worry, He Won’t Get Far on Foot, que tem Joaquin Phoenix como personagem que fica paraplégico após acidente e redescobre sua vida desenhando cartoons polêmicos e controversos.

Aliás, talvez o nome mais famoso em competição era o de Wes Anderson, que estava entre os 19 filmes indicados ao Urso de Ouro com seu segundo trabalho no gênero da animação Ilha de Cachorros, que assim como a primeira animação O Fantástico Sr. Raposo, utiliza-se da técnica do stop-motion. Já me adiantando um pouco, certamente o filme estará entre os indicados ao Oscar 2019 de Melhor Longa de Animação, podendo finalmente render a primeira estatueta ao diretor. Isso, claro, se não houver nenhum mega-sucesso da Pixar no caminho…

Isle of Dogs.jpg

Cena da animação Ilha de Cachorros, de Wes Anderson (pic by imdb.com)

Entre os vencedores, destaque para o primeiro filme do Paraguai a competir oficialmente em Berlim, Las Herederas (The Heiress), de Marcelo Martinessi, que acompanha a trajetória de uma senhora de idade homossexual buscando um recomeço. A produção latina conquistou o prêmio Alfred Bauer (uma espécie de Un Certain Regard do Festival de Cannes que premia um olhar diferenciado) e o de Melhor Atriz para Ana Brun.

O Brasil estava participando com três produções. Duas delas saíram premiadas com o Teddy Bear, que reconhece filmes com temática LGBT: Tinta Bruta, de Marcio Reolon e Filipe Matzembacher, levou como Melhor Filme; enquanto Bixa Travesty, de Claudia Priscilla e Kiko Goifman, ficou como Melhor Documentário. Já o documentário O Processo, de Maria Augusta Ramos, sobre o impechament da ex-presidente Dilma Roussef, terminou em 3º lugar na competição Panorama, votado pelo público.

BREVE NOTA

Claro que é sempre bacana acompanhar um festival internacional que não visa apenas a temporada do Oscar, como tem se tornado festivais como o de Veneza e de Toronto, e que ainda prestigiam a vertente mais política dos filmes autorais, contudo, como sempre aponto aqui no blog, os organizadores do evento deveriam transferir a data para, sei lá, o mês de março ou abril, justamente para não ficar de escanteio enquanto todos os olhos ficam em Hollywood e na festa do Oscar.

Seguem os vencedores da 68ª edição do Festival de Berlim:

URSO DE OURO
Touch Me Not
Dir: Adina Pintilie

URSO DE PRATA – GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
Twarz (Mug)
Dir: Małgorzata Szumowska

URSO DE PRATA – PRÊMIO ALFRED BAUER
The Heiress
Dir: Marcelo Martinessi

URSO DE PRATA – MELHOR DIRETOR
Wes Anderson (Ilha de Cachorros)

URSO DE PRATA – MELHOR ATRIZ
Ana Brun (The Heiress)

URSO DE PRATA – MELHOR ATOR
Anthony Bajon (The Prayer)

URSO DE PRATA – MELHOR ROTEIRO
Manuel Alcalá e Alonso Ruizpalacios (Museum)

URSO DE PRATA – CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA, FIGURINO OU DIREÇÃO DE ARTE
Elena Okopnaya (Dovlatov)

PRÊMIO AUDI CURTA-METRAGEM
Solar Walk
Dir: Réka Bucsi

CURTA-METRAGEM – PRÊMIO DO JÚRI
Imfura
Dir: Samuel Ishimwe

URSO DE OURO – MELHOR CURTA-METRAGEM
The Men Behind the Wall
Dir: Ines Moldavsky

MELHOR FILME DE ESTREANTE
Touch Me Not
Dir: Adina Pintilie

MELHOR DOCUMENTÁRIO
The Waldheim Waltz
Dir: Ruth Beckermann

Documentário italiano ‘Fire at Sea’ leva o Urso de Ouro em Berlim

Fire at Sea

Cena do documentário Fire at Sea, de Gianfranco Rosi (photo by outnow.ch)

TEMA DA IMIGRAÇÃO EUROPÉIA CHEGA AO FESTIVAL MAIS POLÍTICO DE TODOS

No meio da correria do Oscar, o Festival de Berlim anunciou seus vencedores. Em tempos de crise imigratória e xenofobia nas manchetes internacionais, o documentário sobre o tema se mostrou quase uma unanimidade no festival. O filme acompanha a trajetória de imigrantes refugiados de seus países por motivos de guerra, violência e necessidade financeira.

O documentário foca nas jornadas sacrificantes de incontáveis imigrantes oriundos do continente africano, asiático e Oriente Médio até esta ilha italiana chamada Lampedusa. “Nesse momento, tive que pensar em todas aquelas pessoas que não conseguiram sobreviver até chegar a Lampedusa,” ressaltou o diretor Gianfranco Rosi em discurso de agradecimento. “Lampedusa é um lugar generoso. É um reduto de pescadores, e eles sempre abrem seus braços para aqueles que vêm do mar.”

Nesta 66ª edição, a presidente do júri foi ninguém menos do que Meryl Streep. Ela liderou um júri formado por mais sete profissionais, tendo como único pacto “deixar a mente aberta”, ou seja, não ser influenciado pela mídia. Não sei se foi possível atenderem a esse pedido pela pressão que vem dos noticiários diariamente, mas por enquanto, acredito que o documentário foi premiado por suas habilidades de retratar um momento tão triste e desolador da História contemporânea.

O Urso de Prata foi para o drama bósnio de Danis Tanovic, Death in Sarajevo, no qual um hotel hospeda uma delegação de diplomacia internacional, e sua repercussão da equipe de serviço e dos demais hóspedes. Apesar do diretor Tanovic ser frequentador de festivais internacionais, ficou conhecido pelo Oscar de Filme em Língua Estrangeira por Terra de Ninguém em 2002.

E ao contrário do que acontece no Oscar, em Berlim, uma mulher foi coroada melhor diretora. A francesa Mia Hansen-Løve ganhou o prêmio pelo drama Things to Come, protagonizado pela veterana Isabelle Huppert como uma professora de filosofia que precisa lidar com a morte da mãe, sua demissão e com a traição do marido.

Cena de Things to Come, com Isabelle Huppert (photo by outnow.ch)

Cena de Things to Come, com Isabelle Huppert (photo by outnow.ch)

Nas categorias de atuação, a dinamarquesa Trine Dyrholm levou como Melhor Atriz por The Commune, sob a direção de Thomas Vinterberg, que já havia trabalhado antes no icônico filme do Dogma 95, Festa de Família. Já na ala masculina, o estreante Majd Mastoura faturou o prêmio de Ator pelo drama tunisiano Hedi, que também levou o prêmio de Filme de Estréia.

Vencedora de Melhor Atriz por The Commune, Trine Dyrholm (photo by antenna.gr)

Vencedora de Melhor Atriz por The Commune, Trine Dyrholm (photo by antenna.gr)

Concedido para produções inovadoras, o prêmio Alfred Bauer deste ano foi para o filipino Lav Diaz. Seu filme, intitulado A Lullaby to the Sorrowful Mystery, tem a duração light de oito horas. Sim, 485 minutos de puro entretenimento! A sessão teria iniciado às 9h30 da manhã e terminado às 19h, com direito a um intervalo de uma hora! A trama do filme se passa no século XIX, quando estava ocorrendo a revolução das Filipinas contra a Espanha, com destaque para a figura de Andres Bonifacio. A produtora Bianca Balbuena agradeceu à comissão do festival, que permitiu sua inclusão na competição sem impôr qualquer tipo de corte.

A bela fotografia PB do filme A Lullaby to the Sorrowful Mystery, de oito horas. (photo by outnow.ch)

A bela fotografia PB do filme A Lullaby to the Sorrowful Mystery, de oito horas. (photo by outnow.ch)

Embora a presidente do júri seja um ícone hollywoodiano (Streep), não houve qualquer premiação para as produções estreladas por hollywoodianos como o filme Genius, com Colin Firth e Jude Law; ou Alone in Berlin, com Emma Thompson e Brendan Gleeson; ou Midnight Special, novo filme de Jeff Nichols protagonizado por Michael Shannon e Joel Egerton.

Seguem os vencedores da 66ª edição do Festival de Veneza:

URSO DE OURO
Fire At Sea
Dir: Gianfranco Rosi

URSO DE PRATA GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
Death in Sarajevo
Dir: Danis Tanović

PRÊMIO ALFRED BAUER para filme que abre novas perspectivas
A Lullaby To The Sorrowful Mystery
Dir: Lav Diaz

MELHOR DIRETOR
Mia Hansen-Løve (Things To Come)

MELHOR ATRIZ
Trine Dyrholm (The Commune)

MELHOR ATOR
Majd Mastoura (Hedi)

Vencedor de Melhor Ator, Majd Mastoura por Hedi (photo by rbb-online.de)

Vencedor de Melhor Ator, Majd Mastoura por Hedi (photo by rbb-online.de)

MELHOR ROTEIRO
Tomasz Wasilewski (United States Of Love)

PRÊMIO DE CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA
Mark Lee Ping-Bing pela fotografia de Crosscurrent

MELHOR FILME DE ESTRÉIA
Hedi (Inhebbek Hedi)
Dir: Mohamed Ben Attia

URSO DE OURO DE CURTA-METRAGEM
Balada De Um Batráquio
Dir: Leonor Teles

URSO DE PRATA PRÊMIO DO JÚRI DE CURTA-METRAGEM

A Man Returned
Dir: Mahdi Fleifel

PRÊMIO AUDIO DE CURTA-METRAGEM
Jin Zhi Xia Mao
Dir: Chiang Wei Liang

‘Taxi’, de Jafar Panahi, leva o Urso de Ouro no Festival de Berlim 2015

Jafar Panahi se torna taxista em filme vencedor do Urso de Ouro, Taxi (photo by outnow.ch)

Jafar Panahi se torna taxista em filme vencedor do Urso de Ouro, Taxi (photo by outnow.ch)

BERLIM PREMIA FILME POLÍTICO, MAS TAMBÉM PROTESTA PELA PRISÃO DE DIRETOR IRANIANO

Eu sei, eu sei… notícia velha. Estive concentrado no Oscar e como o Festival de Berlim insiste em permanecer em fevereiro, tive que deixar de escanteio. Enfim, estou aqui para registrar os vencedores do 65º Festival de Berlim, que foram anunciados no último dia 14 de fevereiro.

O grande vencedor foi o filme Taxi, do iraniano Jafar Panahi. Quando soube da sinopse do filme, na hora me lembrei daquele quadro-farsa “Táxi do Gugu”, pois basicamente foi o que Panahi fez: ele se transformou num motorista de táxi, mas ao contrário do nosso apresentador sem carisma, seu intuito era conhecer melhor a sociedade iraniana através de diálogos dentro do veículo, que escondia câmeras.

Vale relembrar que em março de 2010, o diretor foi preso por autoridades iranianas depois que descobriram que seu documentário levantava suspeitas de  fraudes na reeleição do presidente Mahmud Ahmadinejad em 2009. Foi sentenciado a prisão domiciliar e teoricamente, não poderia filmar por dez anos.

Muito conhecido por suas críticas sociais, Panahi se firmou como um dos grandes representantes do cinema iraniano com filmes como O Balão Branco e O Círculo, que além de revelarem a situação de seu país, influenciaram outros diretores como Walter Salles. Este é seu primeiro Urso de Ouro. Ele já venceu o Urso de Prata pelo roteiro de Cortinas Fechadas em 2013, e o Urso de Prata do Grande Prêmio do Júri por Fora do Jogo em 2006.

Em prisão domiciliar há quatro anos, Panahi foi representado por familiares na cerimônia de premiação, então quando o presidente do júri, Darren Aronofsky, anunciou seu nome como vencedor, sua sobrinha Hanna Saeidi subiu ao palco para receber o prêmio. Muito emocionada, ela chorou ao pegar o Urso de Ouro e foi amparada por Aronofsky. “Não consigo dizer nada. Estão tão emocionada”, disse entre lágrimas.

Hanna Saeidi se emociona ao receber o Urso de Ouro pelo pai, Jafar Panahi, pelo filme Taxi (photo by http://www.rbb-online.de)

Hanna Saeidi se emociona ao receber o Urso de Ouro pelo tio, Jafar Panahi, pelo filme Taxi (photo by http://www.rbb-online.de)

Embora a idéia do filme seja digna de premiação, o Urso de Ouro para Taxi certamente sofreu algum nível de influência pela continuidade da prisão do diretor por tanto tempo. Por mais que o presidente do júri se esperneie todo pra explicar que a decisão foi unânime entre os demais membros do júri, é praticamente impossível não enxergar esse reconhecimento como uma forma de protesto internacional que busque indiretamente a liberdade do artista em terras iranianas. Apesar de improvável, espero que esse prêmio colabore pelo menos com a redução da pena de Jafar Panahi.

Caso Panahi não estivesse preso, muitos críticos presentes no festival defenderam que o filme Aferim! poderia ser o grande vencedor. Filmado em preto-e-branco, esse western moderno romeno se passa no século XIX, e apresenta uma trama de captura de um escravo cigano que teve um caso com a esposa de seu dono. Seria uma forma de crítica ao escravismo de que persiste na Romênia atual. Apesar do tema sério, Aferim! teria um humor que lembra os antigos filmes de Emir Kusturica. Acabou levando o prêmio de Diretor para Radu Jude, compartilhado com o filme Body, da diretora Malgorzata Szumowska.

Cena de Aferim!, de Radu Jude, que levou o Urso de Prata de Diretor (photo by outnow.ch)

Cena de Aferim!, de Radu Jude, que levou o Urso de Prata de Diretor (photo by outnow.ch)

Já o Grande Prêmio do Júri, uma espécie de segundo lugar, ficou com o chileno Pablo Larraín e seu El Club, que aborda contradições da Igreja Católica através de sacerdotes de uma cidade costeira do Chile. Para quem não se lembra, Larraín foi responsável pelo politicamente inovador No, que concorreu ao Oscar de Filme em Língua Estrangeira em 2013.

Quanto aos prêmios de atuação, ambos foram para a mesma produção. Charlotte Rampling e Tom Courtenay foram reconhecidos por 45 Years, um drama britânico que mostra o impacto sobre um casamento de 45 anos quando o corpo da ex-namorada do marido é encontrado 50 anos depois. É muito bacana ver um ator de 78 anos retornando aos holofotes depois de já ter sido indicado ao Oscar por Doutor Jivago (1965) e O Fiel Camareiro (1983). Já Rampling há tempos merecia um prêmio do naipe de Berlim, pois consegue atuar bem em qualquer gênero ou papel. Como cinéfilo, torço para que ambos estejam no burburinho e consigam até indicações ao Oscar 2016!

Premiados em Berlim: Tom Courtenay e Charlotte Rampling em 45 Years (photo by outnow.ch)

Premiados em Berlim: Tom Courtenay e Charlotte Rampling em 45 Years (photo by outnow.ch)

Apesar de não terem sido premiados, os filmes Cinderella e Mr. Holmes tiveram boas críticas relacionadas aos atores Cate Blanchett e Ian McKellen, respectivamente. Enquanto a primeira interpretou a madrasta má da princesa, o segundo soube humanizar o velho personagem de Arthur Conan Doyle. Quem sabe essas performances também não sobrevivem até o próximo Oscar?

Cate Blanchett como lady Tremaine em Cinderella (photo by outnow.ch)

Cate Blanchett como lady Tremaine em Cinderella (photo by outnow.ch)

Vencedores do 65º Festival de Berlim:

URSO DE OURO
Taxi, de Jafar Panahi

URSO DE PRATA – Grande Prêmio do Júri
El Club (The Club), de Pablo Larraín

URSO DE PRATA – Alfred Bauer Prize
Ixcanul (Ixcanul Volcano), de Jayro Bustamante – para filme que abre novas perspectivas

URSO DE PRATA para MELHOR DIRETOR (empate)
Radu Jade (Aferim!)
Malgorzata Szumowska (Body)

URSO DE PRATA para MELHOR ATRIZ
Charlotte Rampling (45 Years)

URSO DE PRATA para MELHOR ATOR
Tom Courtenay (45 Years)

URSO DE PRATA para MELHOR ROTEIRO
Patricio Guzmán (El boton de nacar) (The Pearl Button)

URSO DE PRATA para MELHOR CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA (empate)
Sturla Brandth Grøvlen (Victoria) – pela câmera
Evgeniy Privin e Sergey Mikhalchuk (Pod electricheskimi oblakami) (Under Electric Clouds) – pela câmera

 

Rampling e Courtenay com seus Ursos de Prata por 45 Years (photo by files.prokerala.com)

Rampling e Courtenay com seus Ursos de Prata por 45 Years (photo by files.prokerala.com)

Indicados ao 65º Festival de Berlim (2015)

65º Festival de Berlim (2015)

65º Festival de Berlim (2015)

FESTIVAL APRESENTA BOA SELEÇÃO COM VETERANOS E TALENTOS PROMISSORES

É curioso ver um ano depois os vencedores do Festival de Berlim 2014 entre os favoritos ao Oscar 2015. Em 2014, o festival premiou Boyhood: Da Infância à Juventude como Melhor Diretor, enquanto O Grande Hotel Budapeste levou o Prêmio Especial do Júri. É uma pena que o festival fique meio de escanteio com a alta temporada de premiações como o BAFTA e o Oscar.

A edição deste ano traz nomes ilustres como Terrence Malick, Kenneth Branagh, Werner Herzog, Oliver Hirschbiegel e Wim Wenders, que será homenageado com o Urso de Ouro pela carreira. Haverá sessões especiais de alguns de seus filmes como O Amigo AmericanoAsas do Desejo e Paris, Texas.

O presidente do júri, Darren Aronofsky (photo by novostimira.com)

O presidente do júri, Darren Aronofsky (photo by novostimira.com)

O júri, presidido pelo diretor de Cisne Negro, Darren Aronofsky, contará ainda com o ator alemão Daniel Brühl, o diretor sul-coreano Bong Joon-ho, a produtora Martha De Laurentiis, a diretora peruana Claudia Llosa, a atriz francesa Audrey Tautou e o produtor executivo norte-americano Matthew Weiner.

Eles terão a tarefa de conferir e avaliar as 23 produções internacionais, concedendo em seguida prêmios que podem mudar o rumo de cineastas promissores como a italiana Laura Bispuri que trouxe seu filme de estréia Vergine Giurata, ou consagrar nomes conhecidos do grande público como Werner Herzog, Peter Greenaway e Terrence Malick.

Além dos nomes mais conhecidos, estou ansioso para conferir os novos trabalhos do diretor chileno Pablo Larraín, que chegou a ser indicado ao Oscar pelo criativo No, e a espanhola Isabel Coixet, que causou furor pelo tocante drama Minha Vida Sem Mim (2003). E bastante curioso pra ver a nova parceria do diretor Bill Condon com o veterano Ian McKellen numa nova aventura de Sherlock em Mr. Holmes. Eles fizeram uma gema sobre a vida do diretor James Whale em Deuses e Monstros (1998), que lhe rendeu o Oscar de Roteiro Adaptado. Particularmente, já considero McKellen um sério candidato a Melhor Ator no Oscar 2016.

Ian McKellen como Sherlock Holmes em Mr. Holmes (photo by outnow.ch)

Ian McKellen como Sherlock Holmes em Mr. Holmes (photo by outnow.ch)

O evento também estará muito bem servido de celebridades no tapete vermelho. Além de figuras carimbadas dos festivais como Juliette Binoche (Nobody Wants the Night), Léa Seydoux (Diary of  a Chambermaid), Charlotte Rampling (45 Years), são aguardadas as presenças de Christian Bale, Natalie Portman (Knight of Cups), Nicole Kidman, James Franco (Queen of the Desert) – sendo que Franco ainda estrela Every Thing Will Be Fine – e Ian McKellen (Mr. Holmes). Até daria pra apostar que os vencedores dos prêmios de atuação estarão entre esses nomes acima, mas como depende demais das preferências do júri, não dá pra descartar premiação para nomes praticamente desconhecidos.

Christian Bale e Natalie Portman em cena de Knight of Cups, novo filme de Terrence Malick: cheiro de prêmios. (photo by outnow.ch)

Christian Bale e Natalie Portman em cena de Knight of Cups, novo filme de Terrence Malick: cheiro de prêmios. (photo by outnow.ch)

Seguem os indicados ao 65º Festival de Berlim:

45 Years
Dir: Andrew Haigh
Reino Unido

Als wir träumten (As We Were Dreaming)
Dir: Andreas Dresen
Alemanha/França

Body
Dir: Malgorzata Szumowska
Polônia

Cha va con va (Big Father, Small Father and Other Stories)
Dir: Phan Dang Di
Vietnã/França/Alemanha/Holanda

Cinderella
Dir: Kenneth Branagh
EUA

Eisenstein in Guanajuato
Dir: Peter Greenaway
Holanda/México/Bélgica/Finlândia

Ixcanul (Ixcanul Volcano)
Dir: Jayro Bustamante
Guatemala/França

Journal d’une femme de chambre (Diary of a Chambermaid)
Dir: Benoit Jacquot
França/Bélgica

Knight of Cups
Dir: Terrence Malick
EUA

Mr. Holmes
Dir: Bill Condon
Reino Unido

Nobody Wants the Night
Dir: Isabel Coixet
Espanha/França/Bulgária

Pod electricheskimi oblakami (Under Electric Clouds)
Dir: Alexey German
Rússia/Ucrânia/Polônia

Queen of the Desert
Dir: Werner Herzog
EUA

Taxi
Dir: Jafar Panahi
Irã

Victoria
Dir: Sebastian Schipper
Alemanha

Yi bu zhi yao (Gone with the Bullets)
Dir: Jiang Wen
China/EUA

Aferim!
Dir: Radu Jude
Romênia/Bulgária/República Tcheca

El boton de nacar (The Pearl Button)
Dir: Patricio Guzman
França/Chile/Espanha

El Club (The Club)
Dir: Pablo Larrain
Chile

Elser (13 Minutes)
Dir: Oliver Hirschbiegel
Alemanha

Every Thing Will Be Fine
Dir: Wim Wenders
Alemanha/Canadá/França/Suécia/Noruega

Ten no chasuke (Chasuke’s Journey)
Dir: Sabu
Japão

Vergine giurata (Sworn Virgin)
Dir: Laura Bispuri
Itália/Suíça/Alemanha/Albânia/Kosovo

Contrariando expectativas, filme chinês ‘Black Coal, Thin Ice’ leva o Urso de Ouro 2014

À esquerda, o ator Liao Fan ao lado do diretor Yi'nan Diao, vencedor do Urso de Ouro por Black Coal, Thin Ice (photo by www.thelocal.de)

À esquerda, o ator Liao Fan ao lado do diretor Yi’nan Diao, vencedor do Urso de Ouro por Black Coal, Thin Ice (photo by http://www.thelocal.de)

Por se tratar de um festival na Alemanha, a imprensa do país estava com altas expectativas de que o Urso de Ouro pudesse vir para casa, ainda mais por haver quatro produções alemãs em disputa, mas o presidente do júri, James Schamus (mais conhecido por produzir filmes do diretor Ang Lee), não estava interessado em patriotagem (talvez com receio de repetir o que Bernardo Bertolucci fez no último Festival de Veneza) e apenas um desses filmes recebeu o prêmio de roteiro: Kreuzweg (Stations of the Cross), que aborda a religião de ponto de vista familiar.

Outro que caiu do cavalo foi o diretor americano Richard Linklater, mundialmente conhecido por sua trilogia: Antes do Amanhecer (1995), Antes do Pôr-do-Sol (2004) e Antes da Meia-Noite (2013). Como suas sessões foram ovacionadas ao final e o filme fora muito bem cotado pela crítica especializada, Linklater aguardava pelo prêmio máximo como reconhecimento de sua ousadia em filmar uma história em 12 anos, mas acabou premiado apenas como Melhor Diretor (ele já havia sido premiado anteriormente por Antes do Amanhecer). Boyhood (sem título e sem previsão de estréia no Brasil) acompanha a vida e o amadurecimento do menino Mason dos 5 até os 17 anos de idade, mas sem exigir a troca de ator, já que ele esperou 12 anos pelo crescimento do ator Ellar Coltrane.

Equipe de Boyhood, da esquerda para a direita: Ethan Hawke, Ellar Coltrane, Patricia Arquette e o diretor Richard Linklater. No detalhe, o menino Coltrane (bigger photo by LA times)

Equipe de Boyhood, da esquerda para a direita: Ethan Hawke, Ellar Coltrane, Patricia Arquette e o diretor Richard Linklater. No detalhe, o menino Coltrane (bigger photo by LA times)

Na coletiva de imprensa dos vencedores, Richard Linklater procurou amenizar a decepção: “Quando a gente faz um filme, é porque sente necessidade de expressar alguma coisa, não é pensando em prêmios. O cinema não é, nem deve ser uma competição. Há espaço para todos.” A produção do filme teve que se virar para levantar a grana, pois nenhum investidor queria apostar dinheiro num filme que levaria mais de 12 anos para ser finalizado e distribuído. A idéia de aguardar por mais de uma década a retomada de uma filmagem soa como ousada e merecia mais reconhecimento, contudo é preciso conferir se essa exigência do diretor foi realmente devida e bem aplicada no filme, e não mera frescura experimental. Segundo depoimento, Linklater teria assemelhado sua idéia aos filmes de François Truffaut estrelados por Jean-Pierre Léaud que acompanham o amadurecimento do personagem Antoine Doinel: Os Incompreendidos (1959), Amor aos 20 Anos (1962), Beijos Proibidos (1968), Domicílio Conjugal (1970) e O Amor em Fuga (1979).

Com tanta insatisfação, a vitória do filme chinês Black Coal, Thin Ice, de Yi’nan Diao só podia ficar indigesta. Pra piorar o quadro, Schamus também premiou o ator Liao Fan. Trata-se apenas do terceiro filme de Diao, que retoma o tema da violência da China contemporânea explorada recentemente por Jia Zhang-Ke em Um Toque de Pecado (que ganhou Melhor Roteiro em Cannes 2013), mas com uma vertente cinema noir detetivesco. Obviamente, o cinema chinês está em alta, mas não significa que todos os filmes de lá são imprescindíveis.

Cena de Black Coal, Thin Ice (photo by elfilm.com)

Cena de Black Coal, Thin Ice (photo by elfilm.com)

Na matéria publicada hoje no jornal O Estado de S. Paulo por Luiz Carlos Merten, ele fala em “incompetência do júri”, metendo o pau no James Schamus. Particularmente, não acredito em más escolhas no âmbito da Arte. Ele foi apenas convidado pelos organizadores do evento e deu seu voto como realizador. Se ele votasse nos melhores segundo a imprensa, não haveria necessidade de um júri, certo? Nessa questão, sou apenas contra a escalação de um júri composto por artistas previamente envolvidos com os concorrentes, seja profissional ou amorosamente, pois permite equívocos como o Leão de Ouro para Um Lugar Qualquer, de Sofia Coppola (ex-namorada do presidente do júri, Quentin Tarantino) e ambigüidades como a Palma de Ouro para A Fita Branca, de Michael Haneke, concedido por sua atriz favorita Isabelle Huppert.

Com um elenco inflado de celebridades internacionais como Ralph Fiennes, Edward Norton, Jude Law, Tilda Swinton, Saoirse Ronan, Léa Seydoux, Owen Wilson, Adrien Brody, Bill Murray, Jeff Goldblum, Willem Dafoe, Harvey Keitel, Tom Wilkinson, F. Murray Abraham e Jason Schwartzman (seria mais fácil citar quem NÃO está no filme!), o diretor Wes Anderson acompanha a rotina do concierge Gustave (Fiennes) no hotel que dá nome ao filme The Grand Budapest Hotel. Como em seus filmes anteriores, Anderson busca extrair um humor inusitado e nada comum de seus atores. No festival, saiu com o Grande Prêmio do Júri (espécie de segundo lugar), e se sobreviver ao ano todo, pode até concorrer nas categorias de Melhor Elenco de 2014…

À esquerda, Ralph Fiennes como o concierge Gustave com o seu leal lobby boy Zero, interpretado por Tony Revolori (photo by outnow.ch)

À esquerda, Ralph Fiennes como o concierge Gustave com o seu leal lobby boy Zero, interpretado por Tony Revolori em The Grand Budapest Hotel (photo by outnow.ch)

Embora o brasileiro Praia do Futuro, de Karim Aïnouz, não ter levado nenhum prêmio como os demais concorrentes sul-americanos, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, filme de estréia de Daniel Ribeiro, levou o Teddy Bear, concedido à melhor produção de temática homossexual.

Vencedores do 64º Festival de Berlim:

URSO DE OURO: Black Coal, Thin Ice (Bai ri yan huo), de Yi’nan Diao

MELHOR DIRETOR: Richard Linklater (Boyhood)

MELHOR ATOR: Liao Fan (Black Coal, Thin Ice)

MELHOR ATRIZ: Haru Kuroki (Little House)

MELHOR ROTEIRO: Dietrich Brüggemann e Anna Brüggemann (Stations of the Cross)

PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Wes Anderson (The Grand Budapest Hotel)

ALFRED BAUER PRIZE: Amar, Beber, Cantar (Aimer, boire et chanter), de Alain Resnais

URSO DE PRATA POR CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA: Zeng Jian pela fotografia de Blind Massage

TEDDY BEAR: Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro

A japonesa Haru Kuroki recebe o Urso de Prata de Melhor Atriz das mãos do vencedor do Oscar Christoph Waltz (photo by japantimes.co.jp)

A japonesa Haru Kuroki recebe o Urso de Prata de Melhor Atriz das mãos do vencedor do Oscar Christoph Waltz (photo by japantimes.co.jp)

Indicados ao 64º Festival de Berlim (2014)

64º Festival de Berlim

64º Festival de Berlim

DEPOIS DE SEIS ANOS, UM REPRESENTANTE BRASILEIRO RETORNA A BERLIM

Com a alta temporada de premiação em Hollywood, acho que os organizadores do Festival de Berlim deveriam repensar seu calendário para que o evento alemão não fique de escanteio na mídia. Particularmente, eu sugeriria uma mudança para o mês de Julho ou Agosto.

Como nesses meses costumam lançar os típicos filmes do verão americano, o Festival de Berlim serviria como um ótimo alento para os cinéfilos que buscam produções com mais conteúdo. Mas enfim, se um dia essa sugestão chegar aos ouvidos dos responsáveis, espero que considerem essa alteração.

Este ano, entre os indicados, finalmente um brasileiro. O quinto longa de Karim Aïnouz, Praia do Futuro, estrelado por Wagner Moura, competirá pela seleção oficial, fato que não ocorria desde 2008, quando Tropa de Elite venceu o prestigioso Urso de Ouro. Filmado em Fortaleza e na Alemanha, a produção manterá seu título em português mesmo em outros países, ao contrário do que aconteceu com O Céu de Suely, que se tornou Love for Sale. “Quem votou mais pela manutenção do título em português foi o agente de vendas do filme, que é alemão. É uma questão de afirmação cultural, de manter a marca da língua portuguesa e do Brasil no mundo”, declarou o diretor em entrevista ao jornal O Globo. Ao contrário do Oscar, o Festival de Berlim já premiou o Brasil em duas oportunidades. Além de Tropa, Central do Brasil levou o Urso de Ouro.

Da esquerda à direita: Clemens Schick, Karim Ainouz e Wagner Moura (photo by cinemascope.com)

Da esquerda à direita: Jesuita Barbosa, Karim Ainouz e Wagner Moura (photo by cinemascope.com.br)

Já na seção Panorama, dois filmes brasileiros concorrem pelo prêmio. Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro, e O Homem das Multidões, de Marcelo Gomes e Cao Guimarães. Embora não se trate da competição principal, demostra que o Cinema Brasileiro ainda possui versatilidades e alternativas ao cinema comercial da Globo Filmes. Mas voltando à seleção oficial, como a maioria sabe, o Festival de Berlim procura filmes com vertentes políticas, sejam abordagens mais diretas como O Povo Contra Larry Flynt, ou indiretas como o iraniano A Separação, então os concorrentes que trabalharam melhor esse viés, terão mais chances de se destacar na premiação, que deve ocorrer no dia 16 de fevereiro.

james schamusO júri deste ano é presidido pelo produtor James Schamus, que ficou conhecido por sua colaboração com o diretor Ang Lee, seja como produtor em O Segredo de Brokeback Mountain e Banquete de Casamento, ou como roteirista em Tempestade de Gelo e Desejo e Perigo. Acompanhando Schamus no júri estão: a produtora de James Bond, Barbara Broccoli, o diretor Michel Gondry (Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças), o ator Tony Leung (Amor à Flor da Pele), a atriz americana recém-indicada ao Globo de Ouro Greta Gerwig (Frances Ha), o vencedor de 2 Oscars de coadjuvante Christoph Waltz (Django Livre), a atriz dinamarquesa Trine Dyrholm (O Amante da Rainha) e a documentarista iraniana Mitra Farahani.

Entre os 15 concorrentes, destaca-se a presença do versátil diretor americano Richard Linklater com Boyhood, estrelado por Ethan Hawke. Juntamente com a atriz Julie Delpy, eles acabam de receber uma indicação ao Oscar pelo roteiro original de Antes da Meia-Noite. Por ter começado a trabalhar no filme desde 2002, o filme desperta a curiosidade de incontáveis cinéfilos. Porém, não houve atraso algum no cronograma. Linklater tinha a estratégia de acompanhar o crescimento do jovem ator Ellar Coltrane, dos 6 aos 17 anos. Contudo, o mais curioso é que as filmagens não acabaram e uma nova versão com mais cenas deve ser exibida em outro festival de peso como Cannes, afirmou o ator Ethan Hawke.

O jovem ator Ellar Coltrane é acompanhado em várias fases da vida em Boyhood (photo by ww.hollywoodreporter.com)

O jovem ator Ellar Coltrane é acompanhado em várias fases da vida em Boyhood (photo by ww.hollywoodreporter.com)

É curiosa a presença na lista do diretor Christophe Gans, mais conhecido por seu filme de ação de época O Pacto dos Lobos. Ele volta a trabalhar com uma trama de suspense/terror em produção de época em A Bela e a Fera. Vale destacar o impecável trabalho de direção de arte de Thierry Flamand, e o peso dos atores Vincent Cassel e a bela Léa Seydoux, que está em alta depois do sucesso de Azul é a Cor Mais Quente.

A reconstrução de época de A Bela e a Fera (photo by www.outnow.ch)

A reconstrução de época de A Bela e a Fera (photo by http://www.outnow.ch)

Como a nova Bela, Léa Seydoux traz um erotismo natural ao filme de Christophe Gans (photo by outnow.ch)

Como a nova Bela, Léa Seydoux traz um erotismo natural ao filme de Christophe Gans (photo by outnow.ch)

Confira a lista de indicados ao Urso de Ouro:

Bai Ri Yan Huo (Black Coal, Thin Ice), de Yinan Diao – CHINA

Boyhood, de Richard Linklater – EUA

Chiisai Ouchi (The Little House), de Yoji Yamada – JAPÃO

Historia del miedo (History of Fear), de Benjamin Naishat – ARGENTINA/URUGUAI/ALEMANHA/FRANÇA

Jack, de Edward Berger – ALEMANHA

Kraftidioten (In Order of Disappearance), de Hans Petter Moland – NORUEGA

Kreuzweg (Stations of the Cross), de Dietrich Brüggemann – ALEMANHA

La belle et la bête (Beauty and the Beast), de Christophe Gans – FRANÇA/ALEMANHA

La tercera orilla (The Third Side of the River), de Celina Murga – ARGENTINA/ALEMANHA/HOLANDA

La voie de l‘ennemi (Two Men in Town), de Rachid Bouchareb – FRANÇA/ARGÉLIA/EUA/BÉLGICA

Macondo, de Sudabeh Mortezai – ÁUSTRIA

Praia do Futuro, de Karim Aïnouz – BRASIL/ALEMANHA

Tui Na (Blind Massage), de Ye Lou – CHINA

Wu Ren Qu (No Man’s Land), de Hao Ning – CHINA

Zwischen Welten (Inbetween Worlds), de Feo Aladag – ALEMANHA

%d blogueiros gostam disto: