ROAD MOVIE DEVE RENDER INDICAÇÕES AO OSCAR 2021 DE DIREÇÃO E ATRIZ
A 77ª edição do Festival de Veneza certamente entrará para a história já por acontecer mesmo diante de uma pandemia. E agora com a premiação de uma diretora asiática, a chinesa Chloé Zhao, algo que não acontecia desde 2001 quando a indiana Mira Nair ganhou o Leão de Ouro por Um Casamento à Indiana.
Apesar de haver um número recorde de oito diretoras indicadas, havia forte expectativa de que a presidente do júri Cate Blanchett reconhecesse uma delas. Infelizmente, Zhao não estava presente na cerimônia, mas agradeceu numa chamada virtual: “Obrigada por nos deixarem participar do festival nesse modo estranho. A gente se vê pela frente!”
A diretora chinesa, que se destacou há três anos com o filme independente Domando o Destino, tornou-se também a primeira diretora mulher a ganhar o prêmio depois de Sofia Coppola, que venceu em 2010 por Um Lugar Qualquer. Como todos sabem, uma vitória no festival italiano tem aumentado consideravelmente as chances no Oscar seguinte.
Só para citar exemplos mais recentes de vencedores do Leão de Ouro, A Forma da Água levou os Oscars de Filme e Diretor para Guillermo del Toro, enquanto Roma levou Diretor para Alfonso Cuarón, e Coringa foi o recordista de indicações, levando Melhor Ator para Joaquin Phoenix e Trilha Original. Com isso, existe uma forte expectativa para que Chloé Zhao se torne a primeira diretora não-branca a ser indicada na categoria. A Searchlight (ex-Fox) vai lançar Nomadlandno dia 04 de Dezembro nos EUA. Já no Brasil, a previsão por enquanto é só para o dia 04 de Fevereiro.
Já para o Grande Prêmio do Júri, que seria uma espécie de segundo colocado, o júri concedeu o prêmio para o mexicano Michel Franco e seu novo filme Nuevo Orden, que é uma distopia social em forma de thriller. Para quem conhece os trabalhos anteriores do diretor, sabe que ele costuma abordar temas mais polêmicos, e este filme não deve fugir do padrão.
Naian González em cena de Nuevo Orden, de Michel Franco
Para Melhor Direção, o japonês Kiyoshi Kurosawa foi lembrado pelo drama de espionagem Wife of a Spy, que foi bastante elogiado na crítica internacional, inclusive muitos alegando que se tratava do melhor filme dele dos últimos anos.
Enquanto na seleção de Melhor Ator, o júri não encontrou dificuldades e premiou o italiano Pierfrancesco Favino pelo thriller sobre terrorismo baseado em fatos reais de Padrenostro, para escolher a Melhor Atriz, Cate Blanchett afirmou que ficou maravilhada por contar com “tantas performances extraordinárias”, já que havia muitos filmes protagonizados por mulheres. O prêmio ficou com a britânica Vanessa Kirby por Pieces of a Woman, que foi adquirido pela Netflix e deve estrear na plataforma digital.
À esquerda, Pierfrancesco Favino em cena de Padrenostro.
Até pouco tempo atrás, a atriz era mais conhecida por seu trabalhos nos filmes de ação Missão: Impossível – Efeito Fallout (2018) e Velozes & Furiosos: Hobbs e Shaw (2019) e pela série da Netflix The Crown, mas já nesta edição de Veneza, estrelava dois dramas na corrida pelo Leão de Ouro: The World to Come e este Pieces of a Woman, no qual ela ela interpreta uma mãe em luto por ter perdido seu bebê. Ela aceitou o prêmio e dedicou a “todas as mães que perderam seus filhos e não tiveram suas histórias contadas”, e agradeceu Shia LaBeouf com quem contracenou no filme.
Vanessa Kirby contracena com Shia LaBeouf em Pieces of a Woman
O prêmio de Roteiro ficou com o indiano Chaitanya Tamhane pelo filme The Disciple, que explora uma jornada pela música Indiana clássica. E o Prêmio do Júri ficou com o russo Andrei Konchalovsky pelo drama soviético Dear Comrades.
Pela mostra paralela Horizontes, presidida pela cineasta Claire Denis, o grande vencedor foi o filme iraniano The Wasteland, de Ahmed Bahrami, que lida com a tensão de trabalhadores numa fábrica de tijolos no ambiente rural.
Confira todos os vencedores desta 77ª edição do Festival de Veneza:
LEÃO DE OURO “Nomadland,” Chloé Zhao
GRANDE PRÊMIO DO JÚRI “New Order,” Michel Franco
LEÃO DE PRATA DE MELHOR DIRETOR Kiyoshi Kurosawa, “Wife of a Spy”
MELHOR ATRIZ Vanessa Kirby, “Pieces of a Woman”
MELHOR ATOR Pierfrancesco Favino, “Padrenostro”
MELHOR ROTEIRO “The Disciple,” Chaitanya Tamhane
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI “Dear Comrades,” Andrei Konchalovsky
PRÊMIO MARCELLO MASTROIANNI DE ATOR JOVEM Rouhollah Zamani, “Sun Children”
MOSTRA HORIZONTES
MELHOR FILME “The Wasteland,” Ahmad Bahrami
MELHOR DIRETOR “Genus Pan,” Lav Diaz
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI “Listen,” Ana Rocha de Sousa
MELHOR ATOR Yahya Mahayni, “The Man Who Sold His Skin”
MELHOR ATRIZ Khansa Batma, “Zanka Contact”
MELHOR ROTEIRO “I Predatori,” Pietro Castellitto
MELHOR CURTA-METRAGEM “Entre tú y milagros,” Mariana Safron
LEÃO DO FUTURO
PRÊMIO LUIGI DELAURENTIIS POR FILME DE ESTREANTE “Listen,” Ana Rocha de Sousa
COMPETIÇÃO DE REALIDADE VIRTUAL
MELHOR VR “The Hangman at Home: An Immersive Single User Experience,”Michelle and Uri Kranot
MELHOR EXPERIÊNCIA VR “Finding Pandora X,” Kiira Benzing
Frances McDormand em cena de Nomadland, de Chloé Zhao (pic by Searchlight Pictures)
VENEZA É O PRIMEIRO EVENTO FÍSICO INTERNACIONAL DE CINEMA PÓS-PANDEMIA
A 77ª edição do Festival de Veneza divulgou sua lista de filmes para as seleções oficiais e para as mostras fora de competição. O evento que acontece entre os dias 2 e 12 de Setembro, sofrerá mudanças drásticas como tapete vermelho virtual e sessões reduzidas e limitadas, já que se trata do primeiro festival físico após a pandemia do Coronavírus.
O diretor artístico, Alberto Barbera, reforçou que “quase metade dos filmes” selecionados para competir pelo Leão de Ouro foram dirigidos por mulheres (8 de 18), e que “foram selecionados exclusivamente com base na qualidade deles”, enfatizando que não optou por qualquer sistema de cotas.
Dentre essas 8 produções, destaca-se Nomadland, o novo filme da diretora chinesa Chloé Zhao, cujo trabalho anterior ‘Domando o Destino’ foi um dos filmes independentes mais aclamados de 2017, recebendo 4 indicações ao Independent Spirit Awards. Baseado no livro homônimo de Jessica Bruder, Nomadland acompanha uma mulher de mais de 60 anos numa jornada pelo oeste americano após perder tudo na Grande Recessão dos anos 30. O filme já vem chamando a atenção desde o ano passado por ter ninguém menos do que Frances McDormand como protagonista. Aliás, tanto o filme quanto McDormand têm grandes chances nesta temporada de premiações, começando em Veneza.
Além de Nomadland, apenas outro filme de estúdio concorre ao Leão de Ouro: The World to Come, de Mona Fastvold, produzido pela Sony Pictures. Embora seja apenas o segundo filme desta diretora norueguesa, ela conta com atores hollywoodianos em seu elenco: Casey Affleck, Katherine Waterston e Vanessa Kirby. O filme centra em dois casais vizinhos que enfrentam dificuldades no isolamento no século XIX. Nesta edição, a Netflix ficou ausente.
Particularmente, estamos ansiosos pelos novos trabalhos de dois diretores: Michel Franco e Kiyoshi Kurosawa. O cineasta mexicano Franco, conhecido pelos polêmicos Daniel & Ana e Depois de Lúcia, retorna com Nuevo Orden, sobre um casamento da alta sociedade interrompido por convidados indesejáveis. Já o diretor japonês, conhecido por seus filmes de terror moderno como A Cura e Pulse, traz Wife of a Spy, um drama histórico passado nos anos 40 com um marido abandonando sua mulher para uma viagem à Manchúria, de onde retorna diferente.
Cena de Nuevo Orden, de Michel Franco (pic by Variety)
Cena de Wife of a Spy, de Kiyoshi Kurosawa (pic by Variety)
Dentre as figurinhas mais carimbadas de festivais estão o egípcio Atom Egoyan com Guest of Honour(estrelado por um forte candidato ao Volpi Cup de Melhor Ator, David Thewlis), o iraniano Majid Majidi com The Sun sobre trabalho infantil, e o israelense Amos Gitai com Laila in Haifa sobre uma discoteca frequentada por israelenses e palestinos.
Destacamos e parabenizamos também o único representante brasileiro em Veneza: Narciso em Férias, da dupla de diretores Renato Terra e Ricardo Calil. O documentário relembra o episódio em que o cantor Caetano Veloso foi preso em 1968 por agentes da Ditadura Militar. O artista conta como ele e Gilberto Gil fora retirados de suas casas em São Paulo poucos dias depois do decreto do AI-5, e permaneceram encarcerados por mais de 50 dias.
Caetano Veloso em cena do documentário Narciso Em Férias, de Renato Terra e Ricardo Calil (pic by Jovem Pan)
O evento abrirá com o filme italiano fora de competição Lacci, de Daniele Luchetti, e estrelado por Alba Rohrwacher e Luigi Lo Cascio. Há 11 anos o festival de Veneza não contava com um filme italiano de abertura. E como já reportado há poucos dias, a atriz Cate Blanchett será a presidente do júri, composto também pelos diretores Christian Petzold e Joanna Hogg.
SELEÇÃO OFICIAL DE VENEZA
EM COMPETIÇÃO
In Between Dying
Dir: Hilal Baydarov (Azerbaijão, EUA)
Le Sorelle Macaluso
Dir: Emma Dante (Itália)
The World to Come
Dir: Mona Fastvold (EUA)
Nuevo Orden
Dir: Michel Franco (México, França)
Lovers
Dir: Nicole Garcia (França)
Guest of Honour
Dir: Atom Egoyan (Canadá)
Laila in Haifa
Dir: Amos Gitai (Israel, França)
Dear Comrades
Dir: Andrei Konchalovsky (Rússia)
Wife of a Spy
Dir: Kiyoshi Kurosawa (Japão)
The Sun
Dir: Majid Majidi (Irã)
Pieces of a Woman
Dir: Kornel Mundruczo (Canadá, Hungria)
Miss Marx
Dir: Susanna Nicchiarelli (Itália, Bélgica)
Padrenostro
Dir: Claudio Noce (Itália)
Notturno
Dir: Gianfranco Rosi (Itália, França, Alemanha)
Never Gonna Snow Again
Dir: Malgorzata Szumowska e Michal Englert (Polônia, Alemanha)
The Disciple
Dir: Chaitanya Tamhane (Índia)
And Tomorrow The Entire World
Dir: Julia Von Heinz (Alemanha, França)
Quo Vadis, Aida?
Dir: Jasmila Zbanic (Bósnia e Herzegovina, Áustria, Romênia, Holanda, Alemanha, Polônia, França, Noruega)
Nomadland
Dir: Chloe Zhao (EUA)
Cena de Lovers, de Nicole Garcia (pic by Variety)
OUT OF COMPETITION – Fiction
Lacci
Dir: Daniele Luchetti (Itália)
Lasciami Andare
Dir: Stefano Mordini (Itália)
Mandibules
Dir: Quentin Dupieux (França, Bélgica)
Love After Love
Dir: Ann Hui (China)
Assandira
Dir: Salvatore Mereu (Itália)
The Duke
Dir: Roger Mitchell (Reino Unido)
Night in Paradise
Dir: Park Soon-Jung (Coréia do Sul)
Mosquito State
Dir: Filip Jan Rymsza (Polônia)
FORA DE COMPETIÇÃO – Não-Ficção
Sportin’ Life
Dir: Abel Ferrara (Itália)
Crazy, Not Insane
Dir: Alex Gibney (EUA)
Greta
Dir: Nathan Grossman (Suécia)
Salvatore – Shoemaker of Dreams
Dir: Luca Guadagnino (Itália)
Final Account
Dir: Luke Holland (Reino Unido)
La Verità Su La Dolce Vita
Dir: Giuseppe Pedersoli (Itália)
Molecole
Dir: Daniele Segre (Itália)
Narciso Em Férias
Dir: Renato Terra, Ricardo Calil (Brasil)
Paolo Conte, Via Con Me
Dir: Giorgio Verdelli (Itália)
Hopper/Welles
Dir: Orson Welles (EUA)
City Hall
Dir: Frederick Wiseman (EUA)
OUT OF COMPETITION – Special Screenings
30 Monedas – Episode 1
Dir: Alex De La Iglesia (Espanha)
Princesse Europe
Dir: Camille Lotteau (França)
Omelia Contadina
Dir: Alice Rohrwacher Jr. (Itália)
HORIZONS
Apples
Dir: Christos Nikou (Grécia)
La Troisieme Guerre
Dir: Giovanni Aloi (França)
Milestone
Dir: Ivan Ayr (Índia)
The Wasteland
Dir: Ahmad Bahrami (Irã)
The Man Who Sold His Skin
Dir: Kaouther Ben Hania (Tunísia, França, Alemanha, Bélgica, Suécia)
I Predatori
Dir: Pietro Castellitto (Itália)
Mainstream
Gia Coppola (EUA)
Genus Pan
Dir: Lav Diaz (Filipinas)
Zanka Contact
Dir: Ismael El Iraki (França, Marrocos, Bélgica)
La Nuit Des Rois
Dir: Philippe Lacote (Costa do Marfim, França, Canadá)
The Furnace
Dir: Roderick Mackay (Austrália)
Careless Crime
Dir: Shahram Mokri (Irã)
Gaza Mon Amour
Dir: Tarzan Nasser, Arab Nasser (Palestina, França, Alemanha, Portugal, Catar)
Selva Tragica
Dir: Yulene Olaizola (México, França, Colômbia)
Guerra e Pace
Dir: Martina Parenti, Massimo D’Anolfi (Itália, Suíça)
Nowhere Special
Dir: Uberto Pasolini (Itália, Romênia, Reino Unido)
Listen
Dir: Ana Rocha De Sousa (Reino Unido, Portugal)
O diretor Pawel Pawlikowski posa com seu Oscar de Filme em Língua Estrangeira este ano por Ida (photo by thehindubissinessline.com)
COM INSCRIÇÕES TERMINADAS, COMEÇAM AS ESPECULAÇÕES
Apesar de não ter havido quebra de recordes, 81 filmes foram selecionados para a disputa pelo Oscar de Filme de Língua Estrangeira, dois a menos do que o ano anterior com 83. A novidade deste ano atende pelo nosso vizinho Paraguai, que inscreveu um longa-metragem pela primeira vez ao prêmio. Embora as chances de vitória não sejam lá das maiores, é bacana ver mais um país latino concorrendo com uma obra que representa sua cultura, e também vale lembrar que a própria Academia tem se demonstrado mais aberta às produções de países sem muito histórico cinematográfico. Nesse ano, por exemplo, a Mauritânia e a Estônia receberam suas primeiras indicações por Timbuktu e Tangerinas, respectivamente. Então por que não sonhar com uma vaga?
E O BRASIL?
O Brasil corre atrás de sua 5ª indicação na categoria, algo que não acontece desde o longínquo ano de 1999, quando Central do Brasil perdeu para o italiano A Vida é Bela. O MinC selecionou a ‘dramédia’ Que Horas Ela Volta?, de Anna Muylaert, que ganhou o título internacional de The Second Mother, em referência ao personagem central de Regina Casé, que vive uma empregada doméstica que cuida do filho dos patrões como se fosse seu.
Cena de Que Horas Ela Volta?, de Anna Muylaert, presentante do Brasil este ano (photo by cine.gr)
O filme funciona bem como crítica social e um retrato das classes brasileiras, assim como comédia graças à atuação de Casé. Ganhou prêmios importantes em festivais como o de Sundance e Berlim, o que sempre ajuda na campanha e também na conquista do próprio público brasileiro que costuma olhar com mais atenção as produções premiadas, mas ainda está bem longe da própria campanha vitoriosa de Central do Brasil. A seleção de Que Horas Ela Volta? me agrada por representar bem o que acontece no país, o que não deixa de ser uma decisão corajosa, mas em termos de chances reais, acredito que o Brasil terá de esperar mais um ano ainda por uma nova indicação.
FAVORITOS ATÉ O MOMENTO
Em se tratando de Oscar de Filme em Língua Estrangeira, digamos que é uma caixinha de surpresas. Às vezes acontece de haver um franco-favorito como o iraniano A Separação ou o austríaco Amor, mas na maioria das vezes a Academia gosta de surpreender, infelizmente pra pior. São raríssimos os casos em que me surpreendi positivamente como quando o argentino O Segredo dos Seus Olhos e do alemão A Vida dos Outros levaram o prêmio batendo os favoritos.
Nessa altura do campeonato ainda é difícil prever os reais favoritos. Muitas vezes a gente se baseia em participações e premiações em grandes festivais como Cannes e Veneza, mas nada é 100% garantido. Ano passado, muitos apostaram no turco Winter Sleep como dono de uma das indicações por ter levado a Palma de Ouro, mas acabou nem passando pras semi-finais. Mas, se existe algum tipo de certeza, o chamado ‘Oscar lock’, este seria o representante húngaro O Filho de Saul, de László Nemes. Além de ter levado o Grande Prêmio do Júri em Cannes, tem o elemento-chave para quase todo filme vencedor desta categoria: 2ª Guerra Mundial e Judeus.
Cena de O Filho de Saul, ainda sem previsão de estréia no Brasil (photo by cine.gr)
A trama do filme se passa em 1944, no campo de concentração de Auschwitz, onde o prisioneiro Saul tem a ingrata tarefa de queimar os corpos de seus colegas até encontrar o corpo daquele que acredita ser seu filho. O filme tem toda a receita pronta para ganhar a estatueta. Podem me cobrar em fevereiro: O Filho de Saul vai ganhar o Oscar.
Além do húngaro, existem alguns filmes que estão sendo bem comentados pela crítica internacional e devem figurar pelo menos na lista dos semi-finalistas, graças ao comitê executivo criado pelo produtor Mark Johnson. Explico. Depois que o super bem criticado filme romeno 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias, de Cristian Mungiu, ficou de fora da categoria de Filme em Língua Estrangeira de 2008, a Academia criou com a ajuda de Johnson um comitê responsável por selecionar três títulos na lista dos nove semi-finalistas para que não dependam exclusivamente dos votos dos velhinhos judeus que assistem às sessões dos filmes estrangeiros. Foi graças aos esforços desse comitê que filmes mais ousados foram indicados como o grego Dente Canino em 2010. Acredito que se esse comitê tivesse existido desde o início dos anos 2000, filmes muito bons porém violentos teriam sido indicados como o brasileiro Cidade de Deus e o sul-coreano Oldboy.
Enfim, águas passadas. Agora o comitê tem a chance de promover mais três filmes relevantes no cenário internacional. Eles têm o chileno O Clube, que tem um tema polêmico de padres católicos que se isolam numa casa após cometerem abuso sexual com menores. O filme é dirigido por Pablo Larraín, anteriormente indicado por No; Tem o sueco Um Pombo Pousou num Galho Refletindo Sobre a Existência, que ganhou o Leão de Ouro de 2014 e tem o nome do diretor veterano Roy Andersson pra ajudar; E de Taiwan, The Assassin concorre como filme mais belo visualmente e a Academia tem uma chance de ouro para premiar um dos melhores diretores asiáticos da atualidade: Hou Hsiao-Hsien, que levou o prêmio de Direção em Cannes este ano. Caso o filme asiático não passe, existe uma boa possibilidade de concorrer nas categorias de Figurino e Direção de Arte.
Bela cena de The Assassin, de Hou Hsiao-Hsien (photo by cine.gr)
Cena de Um Pombo Pousou num Galho Refletindo Sobre a Existência, de Roy Andersson. (photo by cine.gr)
Cena de O Clube, de Pablo Larraín (photo by cine.gr)
Outro representante bem comentado foi o português As Mil e uma Noites: Vol. 2, o Desolado, de Miguel Gomes. Trata-se da segunda parte da trilogia baseada na obra anônima de contos, pelo qual o diretor busca fazer críticas à política econômica atual de seu país. Ao contrário do que acontece com todos os filmes divididos em volumes, esta trilogia toda foi lançada no mesmo ano, totalizando mais de 6 horas de filme. A escolha pelo segundo volume foi uma aposta dos organizadores em Portugal, muito provavelmente para instigar ainda mais os votantes a conferir os demais filmes da trilogia.
Cena de As Mil e uma Noites,: Vol. 2, O Desolado, de Miguel Gomes (photo by outnow.ch)
Vale também citar aqui o filme romeno Aferim!, de Radu Jude, que levou o Urso de Prata de Melhor Diretor no último Festival de Berlim. Filmado em preto-e-branco, esse western moderno romeno se passa no século XIX, e apresenta uma trama de captura de um escravo cigano que teve um caso com a esposa de seu dono. Seria uma forma de crítica ao escravismo de que persiste na Romênia atual. Apresenta uma bela fotografia PB e pode surpreender.
Cena de Aferim!, de Radu Jude (photo by outnow.ch)
MINHA TORCIDA
Como muitos sabem, gosto de defender material diferente no Oscar, especialmente quando o candidato possui características diferentes, criativas, bizarras. Apesar de não ter visto ainda, o representante da Áustria deste ano parece ter todos esses elementos citados. Goodnight Mommy é sobre dois meninos gêmeos que se mudam para uma nova casa com sua mãe depois que ela passa por uma cirurgia plástica facial. Coberto por ataduras no rosto, a mãe se torna irreconhecível pelos filhos.
Cena do terror psicológico Goodnight Mommy, de Severin Fiala e Veronika Franz (photo by outnow,ch)
Existe uma bizarrice que lembra o do grego Dente Canino, mas é nitidamente um filme de terror psicológico, daqueles excelentes que Roman Polanski costumava fazer nos anos 60 e 70. Caso o filme austríaco seja reconhecido por prêmios da crítica americana, existe uma boa chance de ser defendido pelo comitê, caso contrário, não deve passar de uma ótima e corajosa tentativa.
Confira o trailer:
Segue a lista com os 81 filmes inscritos oficialmente para a 88ª edição do Academy Awards:
• AFEGANISTÃO:Utopia
Dir: Hassan Nazer
• ÁFRICA DO SUL: The Two of Us
Dir: Ernest Nkosi
• ALBÂNIA:Bota
Dir: Iris Elezi & Thomas Logoreci
• ALEMANHA: Labirinto de Mentiras (Im Labyrinth des Schweigens)
Dir: Giulio Ricciarelli
• ARGÉLIA:Twilight of Shadows
Dir: Mohamed Lakhdar Hamina
• ARGENTINA:The Clan (El Clan)
Dir: Pablo Trapero
• AUSTRÁLIA:Arrows of the Thunder Dragon
Dir: Greg Sneddon
• ÁUSTRIA:Goodnight Mommy
Dir: Veronika Franz & Severin Fiala
• BANGLADESH:Jalal’s Story
Dir: Abu Shahed Emon
• BÉLGICA:The Brand New Testament
Dir: Jaco Van Dormael
• BÓSNIA HERZEGOVINA:Our Everyday Story
Dir: Ines Tanović
• BRASIL:Que Horas Ela Volta? (The Second Mother)
Dir: Anna Muylaert
• BULGÁRIA:The Judgment
Dir: Stephan Komandarev
• CAMBOJA:The Last Reel
Dir: Sotho Kulikar
• CANADÁ:Félix and Meira
Dir: Maxime Giroux
• CAZAQUISTÃO: Stranger
Dir: Yermek Tursunov
• CHILE:O Clube (El Club)
Dir: Pablo Larraín
• CHINA:Go Away Mr. Tumor
Dir: Han Yan
• COLÔMBIA:O Abraço da Serpente (El Abrazo de la Serpiente)
Dir: Ciro Guerra
• CORÉIA DO SUL: The Throne
Dir: Lee Joon-ik
• COSTA DO MARFIM: Run
Dir: Philippe Lacôte
• COSTA RICA:Imprisoned
Dir: Esteban Ramírez
• CROÁCIA:The High Sun
Dir: Dalibor Matanić
• DINAMARCA:Guerra (Krigen)
Dir: Tobias Lindholm
• ESLOVÁQUIA:Goat
Dir: Ivan Ostrochovský
• ESLOVÊNIA: The Tree
Dir: Sonja Prosenc
• ESPANHA: Flowers
Dir: Jon Garaño & Jose Mari Goenaga
• ESTÔNIA:1944
Dir: Elmo Nüganen
• ETIÓPIA:Cordeiro (Lamb)
Dir: Yared Zeleke
• FILIPINAS:Heneral Luna
Dir: Jerrold Tarog
• FINLÂNDIA:The Fencer
Dir: Klaus Härö
• FRANÇA:Mustang
Dir: Deniz Gamze Ergüven
• GEORGIA:Moira
Dir: Levan Tutberidze
• GRÉCIA:Xenia
Dir: Panos H. Koutras
• GUATEMALA:Ixcanul
Dir: Jayro Bustamante
• HOLANDA: The Paradise Suite
Dir: Joost van Ginkel
• HONG KONG:To the Fore
Dir: Dante Lam
• HUNGRIA:O Filho de Saul (Saul Fia)
Dir: László Nemes
• ÍNDIA:Court
Dir: Chaitanya Tamhane
• IRÃ:Muhammad: The Messenger of God
Dir: Majid Majidi
• IRAQUE:Memories on Stone
Dir: Shawkat Amin Korki
Pôster oficial do 71º Festival de Veneza, que faz alusão ao momento culminante do clássico francês Os Incompreendidos (photo by primetv.pt – image by biennale di Venezia)
EMBORA HAJA NOMES EM POTENCIAL, A DISPUTA PELO PRÊMIO ESTÁ BASTANTE EQUILIBRADA
Apesar do resultado do ano passado ter sido quase motivo de uma CPI (o documentário italiano Sacro GRA foi eleito o vencedor do Leão de Ouro pelo presidente do júri conterrâneo Bernardo Bertolucci), o Festival de Veneza é um dos mais prestigiosos do mundo, além de ser o mais antigo. Ao contrário da veia mais comercial de Cannes, Veneza não tem o costume de se limitar a nomes consagrados para compor suas seleções de filmes.
Contudo, em entrevista, o diretor artístico Alberto Barbera revelou um fracasso para esta edição. Tentou trazer duas produções norte-americanas, cujos diretores são ninguém menos que David Fincher e Paul Thomas Anderson, que levou o Leão de Prata de Melhor Diretor em 2012 por O Mestre. Os dois viriam com Garota Exemplar (Gone Girl) e Inherent Vice, respectivamente, mas as distribuidoras recusaram a proposta para lançá-los no New York Film Festival. Tanto a 20th Century Fox como a Warner alegam que o evento americano ganha a briga por acontecer mais próximo do fim do ano, quando começa a temporada de premiações que culmina com o Oscar, e também por darem valor ao público do próprio país.
Cena com Ben Affleck de Garota Exemplar: preferência por NY a Veneza. (photo by http://www.outnow.ch)
As desculpas são válidas, mas a verdade que li no site The Playlist é que as distribuidoras estão pensando duas vezes antes de mandar elenco e equipe de seus filmes para divulgação internacional para evitar gastos. Simples assim. Pagar passagens aéreas e estadias em hotéis luxuosos nem sempre representam números maiores nas bilheterias; a menos que ganhe um prêmio importante e olhe lá!
Dito isso, a missão de Barbera não foi fácil. Assistiu a 1500 filmes para peneirar 55 sobreviventes, distribuídos em três listas (Competição Oficial, Fora de Competição e Horizontes). “É um trabalho mais complexo, mais doloroso porque tem de deixar de fora alguns filmes muito bons”, afirmou Barbera em comparação a outros festivais de filmes como Toronto, que não apresenta competição e por isso mesmo não há limites de quantidade. Sem Fincher e Anderson, Veneza ainda oferece nomes conhecidos como o do alemão Fatih Akin e do mexicano Alejandro González Iñárritu.
Aliás, o novo filme de Iñárritu, Birdman, abrirá a competição oficial por trazer mais atores mundialmente conhecidos ao tapete vermelho como Michael Keaton, Edward Norton, Naomi Watts e Emma Stone. Por se tratar de uma comédia de humor negro, dificilmente deve levar o Leão de Ouro. Outras presenças ilustres são aguardadas para o evento, casos de Al Pacino e Holly Hunter (ambos por Manglehorn), Ethan Hawke e January Jones (ambos por Good Kill) e Willem Dafoe (Pasolini). Pacino e Dafoe já largam como franco-favoritos na corrida pelo prêmio de interpretação masculina, especialmente Pacino que terá mais um filme (The Humbling) exibido fora de competição.
Cena de Birdman entre Michael Keaton e Edward Norton: comédia de humor negro com clima de Queime Depois de Ler (photo by outnow.ch)
Quanto à seleção oficial, existem nomes interessantes como o do francês Xavier Beauvois que dirigiu o bom Homens e Deuses, que faturou o Grande Prêmio do Júri em Cannes 2010; e o japonês Shin’ya Tsukamoto, que tem uma linguagem visual bem peculiar, especialmente no gênero ficção científica. Mas um dos nomes que podem surpreender é o do norte-americano Joshua Oppenheimer, que este ano foi indicado para Melhor Documentário no Oscar por O Ato de Matar e pode sair do festival com o Leão de Ouro por The Look of Silence.
Já na mostra fora de competição, vale a pena destacar os retornos de dois grandes diretores. Peter Bogdanovich, que estava sumido desde O Miado do Gato (2001), volta com She’s Funny That Way, uma comédia sobre Broadway com Owen Wilson, Jennfer Aniston e Imogen Poots. E Joe Dante, que ficou conhecido por suas doideiras como Gremlins, Piranha e Viagem Insólita, faz sua versão de filme de zumbi, Burying the Ex, focado num casal de namorados formado por Anton Yelchin e Ashley Greene. E também se mostra interessante a reunião de diretores para fazer o filme mosaico Words With Gods, com tema voltado à religião. Nomes como Emir Kusturica, Mira Nair, Hideo Nakata e Hector Babenco já garantem maior atenção da mídia e do público.
INDICADOS AO LEÃO DE OURO
•The Cut Dir: Fatih Akin (Alemanha, França, Itália, Rússia, Canadá, Polônia, Turquia) • A Pigeon Sat on a Branch Reflecting on Existence Dir: Roy Andersson (Suécia, Alemanha, Noruega, França) • 99 Homes Dir: Ramin Bahrani (U.S.) • Tales Dir: Rakhshan Bani E’temad (Irã) • La rancon de la gloire Dir: Xavier Beauvois (França) • Hungry Hearts Dir: Saverio Costanzo (Itália) • Le dernier coup de marteau Dir: Alix Delaporte (França) • Manglehorn Dir: David Gordon Green (EUA) • Birdman or (The Unexpected Virtue of Ignorance) Dir: Alejandro Gonzáles Iñárritu (EUA) • Three Hearts Dir: Benoit Jacquot (France) • The Postman’s White Nights Dir: Andrei Konchalovsky (Rússia) • Il Giovane Favoloso Dir: Mario Martone (Itália) • Sivas Dir: Kaan Mujdeci (Turquia) • Anime Nere Dir: Francesco Munzi (Itália, França) • Good Kill Dir: Andrew Niccol (EUA) • Loin des Hommes Dir: David Oelhoffen (França) • The Look of Silence Dir: Joshua Oppenheimer (Dinamarca, Finlândia, Indonésia, Noruega, Reino Unido) • Nobi Dir: Shin’ya Tsukamoto (Japão) • Red Amnesia Dir: Wang Xiaoshuai (China)
FORA DE COMPETIÇÃO
• Words with Gods Dir: Guillermo Arriaga, Emir Kusturica, Amos Gitai. Mira Nair, Warwick Thornton, Hector Babenco, Bahman Ghobadi, Hideo Nakata, Alex de la Iglesia (México, EUA) • She’s Funny That Way Dir: Peter Bogdanovich (EUA) • Dearest Dir: Peter Ho-sun Chan (Hong Kong, China) • Olive Kitteridge Dir: Lisa Cholodenko (EUA) • Burying the Ex Dir: Joe Dante (EUA) • Perez Dir: Edoardo De Angelis (Itália) • La zuppa del demonio Dir: Davide Ferrario (Itália) • Tsili Dir: Amos Gitai (Israel, Rússia, Itália, França) • La trattativa Dir: Sabina Guzzanti (Itália) • The Golden Era Dir: Ann Hui (China, Hong Kong) • Make Up Dir: Im Kwontaek (Coréia do Sul) • The Humbling Dir: Barry Levinson (EUA) • The Old Man of Belem Dir: Manoel de Oliveira (Portugal, França) • Italy in a Day Dir: Gabriele Salvatores (Itália, Reino Unido) • In the Basement Dir: Ulrich Seidl (Áustria) • The Boxtrolls Dir: Anthony Stacchi, Annable Graham (U.K) • Ninfomaníaca: Volume II (versão longa) Director’s Cut Dir: Lars Von Trier (Dinamarca, Alemanha, França, Bélgica)
HORIZONTES
• Theeb Dir: Naji Abu Nowar (Jordânia, Emirados Árabes Unidos, Catar, Reino Unido) • Line of Credit Dir: Salome Alexi (Georgia, Alemanha, França) • Cymbeline Dir: Michael Almereyda (EUA) • Senza Nessuna Pieta Dir: Michele Alhaique (Itália) • Near Death Experience Dir: Benoit Delepine, Gustave Kervern (França) • Le Vita Oscena Dir: Renato De Maria (Itália) • Realite Dir: Quentin Dupieux (França, Bélgica) • I Spy/I Spy Dir: Veronika Franz, Severin Fiala (Áustria) • Hill of Freedom Dir: Hong Sangsoo (Coréia do Sul) • Bypass Dir: Duane Hopkins (Reino Unido) • The President Dir: Moshen Makhmalbaf (Georgia, França, Reino Unido, Alemanha) • Your Right Mind Dir: Ami Canaan Mann (EUA) • Belluscone, una storia siciliana Dir: Franco Maresco (Itália) • Nabat Dir: Elchin Musaoglu (Azerbaijão) • Heaven Knows What Dir: Josh Safdie, Ben Safdie (EUA, França) • These Are the Rules Dir: Ognjen Svilicic (Croatia, France, Serbia, Macedonia) • Court Dir: Chaitanya Tamhane (Índia)