CAMPION, ALMODÓVAR e SORRENTINO na DISPUTA pelo LEÃO DE OURO. ‘DUNA’ e ‘O ÚLTIMO DUELO’ COMPETEM por FORA

Benedict Cumberbatch em The Power of the Dog

FESTIVAL ITALIANO PROCURA REPETIR PRÉVIA DO OSCAR DAS ÚLTIMAS EDIÇÕES

Logo após o término de um prorrogado Festival de Cannes, o festival de cinema mais tradicional de todos acaba de divulgar seus filmes selecionados da sua 78ª edição. Para quem não se recorda, nos últimos quatro anos, Veneza premiou dois vencedores do Oscar de Melhor Filme: Nomadland e A Forma da Água, e dois fortes indicados: Coringa e Roma. Pelo calendário, Veneza divide as atenções com o Festival de Toronto, mas não há dúvidas que tem se tornado um ótimo chamariz para estúdios lançarem seus filmes e iniciarem a temporada de premiações.

Contudo, apesar de um boa seleção oficial, filmes altamente aguardados como Duna, de Denis Villeneuve, O Último Duelo, de Ridley Scott, e Last Night in Soho, de Edgar Wright, serão exibidos fora de competição. Teria sido alguma ordem dos estúdios, dos realizadores ou simplesmente não qualificaram para a disputa principal pelo Leão de Ouro?

Já dentre os filmes na competição oficial, Pedro Almodóvar abre o festival com Parallel Mothers, teremos também a neozelandesa Jane Campion com The Power of the Dog, Paul Schrader com uma história de vingança The Card Counter, Paolo Sorrentino com The Hand of God, Michael Franco (que venceu o Grande Prêmio do Júri no ano passado por New Order) com Sundown, o retorno do único venezuelano vencedor do Leão de Ouro Lorenzo Vigas com La Caja, a estreia na direção da atriz Maggie Gyllenhaal com The Lost Daughter, adaptação do romance de Elena Ferrante, e a iraniana-americana Ana Lily Amirpour, conhecida por Garota Sombria Caminha Pela Noite, com Mona Lisa and the Blood Moon.

Obviamente, há nomes de atores conhecidos nessas produções que podem levar o Volpi Cup de interpretação. Pelo filme de Gyllenhaal, temos “só” Olivia Colman, Ed Harris, Jessie Buckley e Peter Sarsgaard, enquanto pelo filme de Campion, Benedict Cumberbatch, Kirsten Dunst e Jesse Plemons. A disputa entre as atrizes também ganha os nomes de Penélope Cruz (que compete por Parallel Mothers, de Almodóvar, e Official Competition, da dupla Mariano Cohn e Gastón Duprat), e Kristen Stewart que viveu a Princesa Diana em Spencer, de Pablo Larraín.

Assim como em Cannes, haverá uma mostra paralela intitulada Horizontes Extra, que tem o intuito de acolher mais produções que sofreram com a pandemia e perderam espaço em festivais. Aliás, é nessa mostra que está o único representante do Brasil: 7 Prisioneiros, de Alexandre Moratto, filme sobre tráfico humano com Rodrigo Santoro e Christian Malheiros, que disputou o Independent Spirit Award de Melhor Ator por Sócrates em 2019.

Vale lembrar que este ano, Veneza concederá um Leão de Ouro Honorário pela carreira dos atores Jamie Lee Curtis, que estrela o novo Halloween Kills, que será exibido fora de competição, e Roberto Benigni, que recentemente foi Gepeto na nova adaptação de Pinóquio.

A 78ª edição do Festival de Veneza começa no dia 1º de Setembro e termina no dia 11. O júri será presidido pelo diretor de Parasita, Bong Joon Ho, que contará também com Chloé Zhao (atual vencedora do Oscar e Leão de Ouro por Nomadland), a atriz Virginie Efira (Benedetta), Cynthia Erivo (Harriet), atriz e produtora canadense Sarah Gadon (O Homem Duplicado), o diretor italiano Saverio Costanzo (Hungry Hearts) e documentarista romeno Alexander Nanau, recém-indicado ao Oscar por Collective.

Confira a seleção completa de Veneza:

COMPETIÇÃO

Parallel Mothers, Pedro Almodovar (Espanha) – FILME DE ABERTURA
Mona Lisa and the Blood Moon, Ana Lily Amirpour (EUA)
Un Autre Monde, Stephane Brizé (França)
The Power of the Dog, Jane Campion (Nova Zelândia, Austrália)
America Latina, Damiano D’Innocenzo, Fabio D’Innocenzo (Itália, França)
L’Evenement, Audrey Diwan (França)
Official Competition, Gaston Depart, Mariano Cohn (Espanha, Argentina)
Il Buco, Michelangelo Frammartino (Itália, France, Alemanha)
Sundown, Michel Franco (México, França, Suécia)
Lost Illusions, Xavier Giannoli (França)
The Lost Daughter, Maggie Gyllenhaal (Grécia, EUA, Reino Unido, Israel)
Spencer, Pablo Larrain (Alemanha, Reino Unido)
Freaks Out, Gabriele Mainetti (Itália, Bélgica)
Qui Rido Io, Mario Martone (Itália, Espanha)
On The Job: The Missing 8, Eric Matti (Filipinas)
Leave No Traces, Jan P. Matuszyski (Polônia, França, República Tcheca)
Captain Volkonogov Escaped, Yuriy Borisov (Rússia, Estônia, França)
The Card Counter, Paul Schrader (EUA, Reino Unido, China)
The Hand of God, Paolo Sorrentino (Itália)
Reflection, Valentin Vasyanovych (Ucrânia)
La Caja, Lorenzo Vigas (México, EUA)

FORA DE COMPETIÇÃO – Ficção

Il Bambino Nascosto, Roberto Andò (Itália) – FILME DE ENCERRAMENTO
Les Choses Humaines, Yvan Attal (França)
Ariaferma, Leonardo Di Costanzo (Itália, Suíça)
Halloween Kills, David Gordon Green (EUA)
La Scuola Cattolica, Stefano Mordini (Itália)
Old Henry, Potsy Ponciroli (EUA)
The Last Duel, Ridley Scott (EUA, Reino Unido)
Dune, Denis Villeneuve (EUA, Hungria, Jordânia, Emirados Árabes, Noruega, Canadá)
Last Night in Soho, Edgar Wright (Reino Unido)

FORA DE COMPETIÇÃO – Não-Ficção

Life of Crime 1984-2020, Jon Albert (EUA)
Tranchées, Loup Bureau (França)
Viaggio Nel Crepuscolo, Augusto Contento (França, Itália)
Republic of Silence, Diana El Jeiroudi (Alemanha, França, Síria, Catar)
Hallelujah: Leonard Cohen, A Journey, A Song, Daniel Geller, Dayna Goldfine (EUA)
DeAndré#Deandré Storia di un Impiegato, Roberta Lena (Itália)
Django & Django, Luca Rea (Itália)
Ezio Bosso. Le Cose Che Restano, Giorgio Verdelli (Itália)

FORA DE COMPETIÇÃO – Série de TV

“Scenes From a Marriage” (episodes 1-5), Hagai Levi (EUA)

HORIZONTES

Les Promesses, Thomas Kruithof (França) – FILME DE ABERTURA
Atlantide, Yuri Ancarani (Itália, França, EUA, Catar)
Miracle Bogdan George Apetri (Romênia, República Tcheca, Letônia)
Pilgrims, Laurynas Bareisa (Lituânia)
The Peackock’s Paradise, Laura Bispuri (Itália, Alemanha)
The Falls, Chung Mong-Hong (Taiwan)
El Hoyo En La Cerca, Joachin Del Paso (México, Polônia)
Amira, Mohamed Diab (Egito, Jordânia, Emirados Árabes, Arábia Saudita)
A Plein Temps, Eric Gravel (França)
107 Mothers, Peter Kerkekes (Eslovênia, República Tcheca, Ucrânia)
Vera Dreams of the Sea, Kaltrina Krasniqi (Albânia, Macedônia do Norte)
White Building, Kavich Neang (Camboja, França, China, Catar)
Anatomy of Time, Jakrawal Nilthamrong (Tailândia, França, Holanda, Singapura, Alemanha)
El Otro Tom, Rodrigo Pla, Laura Santullo (México, EUA)
El Gran Movimiento, Kiro Russo (Bolívia, França, Catar, Suíça)
Once Upon a Time in Calcutta, Adita Vikram Sengupta (Índia, França, Noruega)
Rhino, Oleg Sentsov (Ucrânia, Polônia, Alemanha)
True Things, Harry Wootliff (Reino Unido)
Inu-Oh, Yuasa Masaaki (Japão, China)

HORIZONTES EXTRA

Land of Dreams, Shirin Neshat, Shoja Azari (EUA, Alemanha, Catar) — FILME DE ABERTURA
Costa Brava, Mounia Akl (Líbano, França, Espanha, Suécia, Dinamarca, Noruega, Catar)
Mama, I’m Home, Vladimir Bitokov (Rússia)
Ma Nuit, Antoinette Boulot (França, Bélgica)
La Ragazza Ha Volato, Wilma Labate (Itália, Eslovênia)
7 Prisoners, Alexandre Moratto (Brasil)
The Blind Man Who Did Not Want to See Titanic, Teemu Nikki (Finlândia)
La Macchina Delle Immagini di Alfredo C, Roland Sejko (Itália)

IRANIANO ‘THERE IS NO EVIL’ GANHA o URSO DE OURO em BERLIM

golden berlin bear

Equipe de There is No Evil segura coletivamente o Urso de Ouro em homenagem ao diretor Mohammad Rasoulof, impossibilitado de comparecer ao festival (pic by Teller Report)

FILME QUE CRITICA A PENA DE MORTE NO IRÃ É O GRANDE VENCEDOR

Neste sábado, dia 29/02, o presidente do júri Jeremy Irons revelou os vencedores da 70ª edição do festival alemão, anunciando a vitória do longa iraniano. There is no Evil, que apresenta quatro histórias, busca questionar a morte como forma de punição no país da Ásia. Curiosamente, o diretor Mohammad Rasoulof não pôde comparecer ao festival, pois seu passaporte fora confiscado pelas autoridades iranianas, que alega que o cineasta fazia propaganda contra o atual governo. Em 2017, seu filme A Man of Integrity (Um Homem de Integridade), que venceu o prêmio Un Certain Regard, criticava o sistema corrupto e injusto do Irã, já havia ocasionado um ano de detenção para o diretor.

Assim, a equipe e os atores do filme, incluindo a filha do diretor, Baran Rasoulof, subiram ao palco para receber o prêmio. “Obviamente estou muito feliz, mas ao mesmo tempo estou muito triste, porque este prêmio é para um diretor que não pôde estar aqui. E em nome da equipe, digo que isso (o prêmio) é dele”, disse a emocionada filha do diretor, que logo depois fez uma breve live com o pai pelo celular para que ele pudesse testemunhar à distância o público aplaudindo sua vitória.

Pra quem não conhece muito a história do festival alemão, Berlim tem uma tradição de premiar filmes mais controversos de cunho sócio-político. E nesse aspecto, podemos dizer que o júri acertou em cheio. Além do filme polêmico iraniano, o Grande Prêmio do Júri foi para o filme americano sobre aborto Never Rarely Sometimes Always. Com uma passagem marcante pelo último Festival de Sundance, o filme acompanha duas jovens amigas que juntam uma grana pra viajar para Nova York e realizar o aborto de uma delas. No palco, a diretora Eliza Hittman agradeceu aos médicos e às clínicas de aborto legalizadas nos EUA, que possibilitam essa liberdade feminina.

Para Direção, o júri selecionou o sul-coreano Hong Sang Soo por The Woman Who Ran. Pra quem conhece seus filmes, Soo costuma filmar suas personagens conversando sobre vários temas enquanto caminham, passando do trivial ao filosófico e ético. Mais uma vez, ele contou com sua atriz favorita Min-Hee Kim, que interpreta uma mulher casada há 5 anos que tem uma rara oportunidade de ficar desacompanhada e poder fazer uma avaliação de seu relacionamento com amigas.

Hong-Sangsoo-Eldiario.es

O diretor Hong Sang-Soo que venceu por The Woman Who Ran (pic by eldiario.es)

Pelas categorias de atuação, o italiano Elio Germano conquistou o prêmio de Melhor Ator por interpretar o pintor suíço Antonio Ligabue, que mesmo tendo passado boa parte da vida na Itália, sofrendo com problemas físicos e mentais, e internado em manicômios, almejava uma vida mais normal. A transformação do ator no filme Hidden Away (Volevo Nascondermi) conquistou o júri de forma unânime. Já a alemã Paula Beer levou Melhor Atriz por Undine, no qual sua personagem passional tem uma interação com uma entidade mitológica vingativa chamada Ondina.

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Elio Germano no papel e recebendo o Urso de Prata

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Paula Beer no filme Undine e com o Urso de Prata

Para Roteiro, os vencedores foram os irmãos italianos Fabio e Damiano D’Innocenzo, que em Favolacce, acompanham famílias dos subúrbios de Roma com uma pegada de fábula. Talvez tenha sido o prêmio mais questionado pela mídia internacional.

Este ano, o prêmio Alfred Bauer, que costuma reconhecer trabalhos mais inovadores, teve seu nome alterado para Prêmio da 70ª Edição de Berlim, pois recentemente descobriram que Bauer era um cineasta afiliado ao partido nazista! Sob o novo nome, o filme vencedor foi a comédia francesa Delete History, sobre uma família que busca se desvencilhar do vício das mídias sociais.

E o prêmio de contribuição artística foi para o diretor de fotografia Jürgen Jürges por DAU. Natasha, que é um projeto ousado que recria a União Soviética na era de Stalin em estúdio para que atores encenem a vida daquela época. Embora tenha sido premiado pela fotografia, o filme chama a atenção pelo sexo explícito e pela violência não-encenada. A mensagem do filme seria justamente criticar o excesso de autoridade de um diretor em um set de filmagem. Hello, Abdelatif Kechiche?

Embora o filme brasileiro Todos os Mortos não tenha levado nenhum prêmio, o Brasil esteve representado em co-produções vitoriosas como o colombiano Los Conductos, de Camilo Restrepo, que venceu o prêmio de Melhor Filme de Estreante.

Dentre as produções que saíram de mãos vazias está o novo trabalho de Kelly Reichardt, First Cow, assim como do ditetor malaio Tsai Ming-Liang, Days, que chegou a figurar como um dos favoritos a levar o Urso de Ouro até a reta final do festival.

Seguem os vencedores da 70ª edição do Festival de Berlim:

URSO DE OURO
There Is No Evil 
Dir: Mohammad Rasoulof

URSO DE PRATA GRANDE PRÊMIO DO JÚRI
Never Rarely Sometimes Always

Dir: Eliza Hittman

URSO DE PRATA DE MELHOR DIRETOR
Hong Sang Soo (The Woman Who Ran)

URSO DE PRATA DE MELHOR ATRIZ
Paula Beer (Undine)

URSO DE PRATA DE MELHOR ATOR
Elio Germano (Hidden Away)

URSO DE PRATA DE MELHOR ROTEIRO
Bad Tales (Favolacce)
Dir: irmãos D’Innocenzo

URSO DE PRATA DA 70ª BERLINALE
Delete History

Dir: Benoît Delépine e Gustave Kervern

URSO DE PRATA DE CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA, FIGURINO OU DESIGN DE PRODUÇÃO
Jürgen Jürges (DAU. Natasha)

PRÊMIO DE DOCUMENTÁRIO
Irradiated

Dir: Rithy Panh

MELHOR FILME DE ESTREANTE
Los Conductos
Dir: Camilo Restrepo

URSO DE OURO DE MELHOR CURTA
T
Dir: Keisha Rae Witherspoon

URSO DE PRATA DE MELHOR CURTA PRÊMIO DO JÚRI
Filipiñana

Dir: Rafael Manuel

PRÊMIO AUDI DE CURTA
Genius Loci

Dir: Adrien Mérigeau

SEIS DIRETORAS DISPUTAM O URSO DE OURO no FESTIVAL DE BERLIM

First Cow

John Magaro em cena de First Cow, de Kelly Reichardt (pic by IMDb)

FESTIVAL QUE TEM HISTÓRICO SÓCIO-POLÍTICO APRESENTA MOMENTOS DE TENSÃO

A 70ª edição do Festival Internacional de Berlim começou no último dia 20 de Fevereiro sob inúmeros temas políticos, a começar pela substituição no comando do evento. Após quase 20 anos, o alemão Dieter Kosslick cedeu seu posto de diretor artístico do festival para o italiano Carlo Chatrian, enquanto a holandesa Mariette Rissenbeek se tornou a diretora executiva. Com essa alteração, já foi possível perceber um aumento de diretores desconhecidos, assim como de diretoras na disputa principal pelo Urso de Ouro.

Dos 18 filmes indicados, seis são dirigidos por mulheres: Sally Potter, Eliza Hittman, Kelly Reichardt, Natalia Meta, Stéphanie Chuat e Véronique Reymond (que dirigiram Schwesterlein), e  Jekaterina Oertel, que co-dirigiu DAU.Natasha.

The Roads not Taken

Javier Bardem e Elle Fanning em cena de The Roads Not Taken, de Sally Potter (pic by OutNow.CH)

Contudo, elas serão avaliadas por um júri presidido pelo ator britânico Jeremy Irons, que logo no início decidiu se explicar sobre seus comentários antigos de conteúdo machista e homofóbico resgatados em redes sociais. O ator disse ser a favor dos direitos femininos, que aprova casamento do mesmo sexo (desde que aprovado nas leis do país), e que seria a favor do aborto (se for a decisão da mulher). Não querendo ser advogado do diabo aqui, mas todos têm direito de errar e de se redimir, ainda mais por declarações antigas (vide as polêmicas de Twitter), já que todos amadurecemos, mas esperamos que suas opiniões pessoais não interfiram em suas decisões, apenas seu critério fílmico.

Jeremy Irons

O presidente do júri, o ator britânico Jeremy Irons, pronuncia-se sobre os temas polêmicos e pessoais (pic by Deadline)

Ainda sobre o júri, um dos integrantes é o cineasta brasileiro Kleber Mendonça Filho, diretor de Aquarius e Bacurau.  Na coletiva de imprensa, ele se demonstrou bastante preocupado com a situação delicada do Cinema Brasileiro. “Temos cerca de 600 projetos que estão atualmente congelados por causa da burocracia (do governo)”, disse Kleber.

Kleber

Em coletiva de imprensa, o diretor brasileiro Kleber Mendonça Filho expressa preocupação com o futuro do Cinema Brasileiro (pic by Folha de S. Paulo)

Da mesma forma preocupada, a produtora brasileira Sara Silveira, que estava na coletiva de imprensa do único filme brasileiro indicado ao Urso de Ouro, Todos os Mortos, dos diretores Marco Dutra e Caetano Gotardo, fez uma declaração sobre a censura do governo: “Eu não preciso de armas, eu preciso de força, de amor, de coragem e de momentos heróicos para suportar o que nós estamos vivendo. Mas aguardem, nós vamos resistir! Nós vamos vencer! Nós, todas as raças, todos os gêneros, os artistas, estamos juntos, todos estamos aqui gritando por liberdade, democracia, contra a censura e resistência!”. 

Infelizmente, com a ideologia do governo Bolsonaro, os cineastas brasileiros terão de ser ainda mais criativos para driblar os obstáculos para continuar fazendo filmes no país. Com a Ancine congelada, e o presidente nomeando uma pastora (!) para comandar a instituição da cultura, o Cinema Nacional corre sérios riscos de voltar aos anos 80.

Já sobre o filme Todos os Mortos, a estréia foi vista com frieza, inclusive com jornalistas abandonando a sessão. Embora filme se passe em 1899, dez anos após a abolição da escravidão, os personagens vivem na cidade de São Paulo atual, com intenção de demonstrar ao público que o comportamento racial de mais de 100 anos atrás persiste nos dias atuais. A perspectiva altamente brasileira porém não agradou o público internacional, e o jornalista Bruno Ghetti da Folha de S. Paulo cogitou como origem da recepção fraca o fato do foco narrativo pertencer aos personagens brancos, além dos dois diretores do filme serem brancos de classe média.

Mas voltando ao Festival de Berlim, logo no primeiro dia, houve um minuto de silêncio em homenagem às nove vítimas fatais de um atentado de cunho racista em Hanau, cidade bem próxima de Frankfurt.

Silence Minute

Da esquerda para a direita: o ator e host Samuel Finzi, a diretora executiva Mariette Rissenbeek e o diretor artístico Carlo Chatrian prestam homenagens às vítimas do atentado no primeiro dia do 70º Festival de Berlim (pic by china.org.ch)

Dentre os destaques deste ano, estão os novos filmes de: Abel Ferrara, Siberia, que seria descrito como uma exploração da linguagem dos sonhos; de Christian Petzold, Undine, uma história de amor e traição; e de Kelly Reichardt, First Cow, acompanha histórias de descobertas do oeste americano envolvendo a primeira vaca para contar sobre a origem do sonho Americano.

Vale destacar também a estréia internacional do drama Never Rarely Sometimes Always, que acompanha duas amigas da Pennsylvania que partem para Nova York em busca de ajuda médica para um aborto. No último festival de Sundance, o filme foi um dos maiores sucessos e ganhou um prêmio especial do júri.

Never Rarely

Sidney Flanigan em cena de Never Rarely Sometimes Always, de Eliza Hittman, que trata sobre o aborto nos EUA (pic by OutNow.CH)

O 70º Festival de Berlim termina no dia 1º de Março, quando os vencedores serão anunciados. Confira todos os 18 indicados ao Urso de Ouro, que já foi conquistado pelo Brasil em duas ocasiões: em 1998, com Central do Brasil, e em 2008, com Tropa de Elite.

INDICADOS AO URSO DE OURO 2020:

Berlin Alexanderplatz
Dir: Burhan Qurbani

DAU. Natasha
Dir: Ilya Khrzhanovskiy, Jekaterina Oertel

The Woman Who (Ran Domangchin yeoja)
Dir: Hong Sang-soo

Delete History (Effacer l’historique)
Dir: Benoît Delépine, Gustave Kervern

The Intruder (El prófugo)
Dir: Natalia Meta

Bad Tales (Favolacce)
Dir: Damiano & Fabio D’’Innocenzo

First Cow
Dir: Kelly Reichardt

Irradiated (Irradiés)
Dir: Rithy Panh

The Salt of Tears (Le sel des larmes)
Dir: Philippe Garrel

Never Rarely Sometimes Always
Dir: Eliza Hittman

Days (Rizi)
Dir: Tsai Ming-Liang

The Roads Not Taken
Dir: Sally Potter

My Little Sister (Schwesterlein)
Dir: Stéphanie Chuat, Véronique Reymond

There Is No Evil (Sheytan vojud nadarad)
Dir: Mohammad Rasoulof

Siberia
Dir: Abel Ferrara

All the Dead Ones (Todos os mortos)
Dir: Caetano Gotardo, Marco Dutra

Undine
Dir: Christian Petzold

Hidden Away (Volevo nascondermi)
Dir: Giorgio Diritti

 

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