‘Hoje Eu Quero Voltar Sozinho’ representará o Brasil no Oscar 2015

Pôster nacional de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (photo by jornalpontoinicial.com.br)

Pôster nacional de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (photo by jornalpontoinicial.com.br)

LONGA DE ESTRÉIA DE DANIEL RIBEIRO BATE CINEASTAS EXPERIENTES

Nesta última quinta-feira, dia 18/09, o Ministério da Cultura (MinC) anunciou o representante do Brasil no Oscar 2015 na categoria Melhor Filme em Língua Estrangeira. O primeiro longa-metragem do jovem Daniel Ribeiro, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, bateu outras 17 produções nacionais e tentará conquistar uma das cinco vagas finalistas a serem anunciadas no dia 15 de janeiro.


Vídeo extraído de canal ministeriodacultura do Youtube

A comissão especial responsável pela decisão era composta por Jefferson De (diretor, produtor e roteirista), Luis Erlanger (jornalista), Sylvia Regina Bahiense Naves (coordenadora-geral de Desenvolvimento Sustentável do Audiovisual da Secretaria do Audiovisual do MinC), Orlando de Salles Senna (presidente do conselho da Televisão América Latina) e George Torquato Firmeza (ministro do Departamento Cultural do Minstério das Relações Exteriores). Eles tiveram a tarefa de selecionar apenas um filme entre os seguintes:

A Grande Vitória, de Stefano Capuzzi
A Oeste do Fim do Mundo, de Paulo Nascimento
Amazônia, de Thierry Ragobert
Dominguinhos, de Eduardo Nazarian, Joaquim Castro e Mariana Aydar
Entre Nós, de Paulo Morelli
Exercício do Caos, de Frederico Caos
Getúlio, de João Jardim
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro
Jogo de Xadrez, de Luís Antônio Pereira
Minhocas, de Paolo Conti e Arthur Nunes
Não Pare na Pista: A Melhor História de Paulo Coelho, de Daniel Augusto
O Homem das Multidões, de Marcelo Gomes e Cao Guimarães
O Lobo atrás da Porta, de Fernambo Coimbra
O Menino e o Mundo, de Alê Abreu
O Menino no Espelho, de Guilherme Fiúza Zenha
Praia do Futuro, de Karim Aïnouz
Serra Pelada, de Heitor Dhalia
Tatuagem, de Hilton Lacerda

Confesso que estava receoso de que o MinC optaria por uma das produções da Globo Filmes (Getúlio, Minhocas, Entre Nós ou Serra Pelada) simplesmente pelo nome e poder de publicidade da produtora, mas felizmente, assim como ocorreu no ano passado, a comissão soube escolher com coerência. Hoje Eu Quero Voltar Sozinho marcou presença no último Festival de Berlim, de onde conquistou o FIPRESCI award (concedido pela federação de crítica internacional) e o Teddy Bear, uma espécie de Urso de Ouro para filmes com temática LGBT. Vale destacar que também ganhou prêmios do público em festivais como o L.A. Outfest (EUA) e o Festival de Guadalajara (México).

O filme, que ganhou o título internacional The Way He Looks, acompanha o amadurecimento do jovem estudante cego Leonardo (Ghilherme Lobo) a partir da chegada de um novo colega de classe, Gabriel, enquanto tenta lidar com a superproteção dos pais. O diretor Daniel Ribeiro procura evitar cenas clichês sobre homossexualismo, deixando os sentimentos se desenvolverem naturalmente e sem pressa. Curiosamente, a produção se baseia no curta-metragem de título semelhante (Eu Não Quero Voltar Sozinho) do mesmo diretor e com os mesmos atores centrais nos mesmos papéis, lançado em 2010.

Da esquerda para a direita: os atores (photo by berlinda.org)

Da esquerda para a direita: os atores Fabio Audi, Tess Amorim e Ghilherme Lobo (photo by berlinda.org)

A ministra da Cultura, Marta Suplicy, elogiou a escolha do júri e defendeu o selecionado: “… uma produção de linguagem universal, aberta à compreensão e a conexão com os mais diversos públicos”. Se no ano anterior, a aposta era na temática da insegurança em O Som ao Redor, este ano, a universalidade do tema homossexual na adolescência pode ser uma boa alternativa para que o Brasil consiga finalmente sua 5ª indicação na categoria. As demais foram: O Pagador de Promessas (em 1963), O Quatrilho (1996), O Que é Isso, Companheiro? (1998) e Central do Brasil (1999).

A Ministra da Cultura Marta Suplicy (aquela do "relaxa e goza!") com membros da comissão durante anúncio do Oscar (photo by Thaís Mallon em www.cultura.gov.br)

A Ministra da Cultura Marta Suplicy (aquela do “relaxa e goza!”) com membros da comissão durante anúncio do Oscar (photo by Thaís Mallon em http://www.cultura.gov.br)

SEXO E A POLÍTICA

Em tempos em que a política brasileira tenta intervir demais na sexualidade de jovens, nada mais propício que a sexóloga  e ministra Marta Suplicy (PT) anuncie um filme de temática homossexual como vencedor. Sempre  ligada aos eventos como a Parada Gay de São Paulo, ela defendeu o uso do “kit gay”, que contém material informativo sobre homossexualismo em vídeos e livros como “Homem Brinca de Boneca?”, de Marcos Ribeiro, para crianças de 6 anos em escolas públicas. Em 2012, a medida polêmica foi veementemente criticada por colegas de profissão como o deputado Jair Bolsonaro (PP), gerando um conflito sem solução.

É triste ver que a sexualidade se tornou apenas uma pauta dos programas de governo de candidatos. Marina Silva, do PSB, por exemplo, vinha defendendo o casamento gay, mas para obter apoio da Igreja Evangélica, teve que recuar e dizer “Casamento é entre pessoas de sexo diferente”. Além disso, retirou uma proposta que criminalizaria a homofobia no Brasil. Tal mudança foi elogiada pelo pastor Silas Malafaia, da Assembléia de Deus: “O ativismo gay está irado com Marina! Começo a ficar satisfeito! Valeu a pressão de todos. Não estamos aqui pra engolir agenda gay.”

A política retrógrada brasileira busca rotular por gênero, sexo e cor simplesmente para obter votos. Uma das piores medidas do governo petista foi a criação das cotas raciais para universidades, o que apenas atesta que para eles o negro não tem capacidade de conquistar sua própria vaga nas universidades.

CONCORRÊNCIA NO OSCAR 2015

Havia uma expectativa de que o representante brasileiro pudesse concorrer com outro filme LGBT: o francês Azul é a Cor Mais Quente, de Abdellatif Kechiche. Fora da disputa no Oscar deste ano por ter sido lançado na França fora do prazo estipulado, o filme que aborda o relacionamento lésbico entre duas jovens foi recentemente abandonado pela comissão francesa, que preferiu lançar Saint Laurent, de Bertrand Bonello. Curiosamente, a produção que centra no universo da moda e na vida do estilista Yves Saint Laurent, também tem Léa Seydoux no elenco.

Saint Laurent, de Bertrand Bonello (photo by outnow.ch)

Helmut Berger em cena de Saint Laurent, de Bertrand Bonello (photo by outnow.ch)

Até o momento, a lista de representantes estrangeiros no Oscar 2015 está assim:

  • AFEGANISTÃO: A Few Cubic Meters of Love
    Dir: Jamshid Mahmoudi
  • ALEMANHA: Beloved Sisters
    Dir: Dominik Graf
  • ARGENTINA: Relatos Selvagens (Relatos Salvajes)
    Dir: Damián Szifrón
  • AUSTRÁLIA: Charlie’s Country
    Dir: Rolf de Heer
  • ÁUSTRIA: The Dark Valley
    Dir: Andreas Prochaska
  • AZERBAIJÃO: Nabat
    Dir: Elchin Musaoglu
  • BANGLADESH: Glow of the Firefly
    Dir: Khlaid Mahmood Mithu
  • BÉLGICA: Two Days, One Night
    Dir: Jean-Pierre e Luc Dardenne
  • BOLÍVIA: Forgotten
    Dir: Carlos Bolado
  • BÓSNIA HERZEGOVINA: With Mom
    Dir: Faruk Loncarevic
  • BRASIL: Hoje Eu Quero Voltar Sozinho
    Dir: Daniel Ribeiro
  • BULGÁRIA: Bulgarian Rhapsody
    Dir: Ivan Nitchev
  • CANADÁ: Mommy
    Dir: Xavier Dolan
  • CHILE: Matar um Homem
    Dir: Alejandro Fernández Almendras
  • CHINA: The Nightingale
    Dir: Philippe Muyl
  • COLÔMBIA: Mateo
    Dir: Maria Gamboa
  • CORÉIA DO SUL: Sea Fog
    Dir: Sung Bo Shim
  • COSTA RICA: Red Princesses
    Dir: Laura Astorga
  • CROÁCIA: Cowboys
    Dir: Tomislav Mrsic
  • CUBA: Conducta
    Dir: Ernesto Daranas
  • DINAMARCA: Sorrow and Joy
    Dir: Nils Malmros
  • EQUADOR: Silence in Dreamland
    Dir: Tito Molina
  • ESLOVÁQUIA: A Step Into the Dark
    Dir: Miloslav Luther
  • ESLOVÊNIA: Seduce Me
    Dir: Marko Santic
  • ESPANHA: Living is Easy with Eyes Closed
    Dir: David Trueba
  • ESTÔNIA: Tangerines
    Dir: Zaza Urushadze
  • ETIÓPIA: Difret
    Dir: Zeresenay Berhane Mehari
  • FILIPINAS: Norte, the End of History
    Dir: Lav Diaz
  • FINLÂNDIA: Concrete Night
    Dir: Pirjo Honkasalo
  • FRANÇA: Saint Laurent
    Dir: Bertrand Bonello
  • GEORGIA: Corn Island
    Dir: Giorgi Ovashvili
  • GRÉCIA: Little England
    Dir: Pantelis Voulgaris
  • HOLANDA: Accused
    Dir: Paula van der Oest
  • HONG KONG: The Golden Era
    Dir: Ann Hui
  • HUNGRIA: White God
    Dir: Kornél Mundruczó
  • ÍNDIA: Liar’s Dice
    Dir: Gheetu Mohandas
  • INDONÉSIA: Soekarno
    Dir: Hanung Bramantyo
  • IRÃ: Today
    Dir: Reza Mir-Karimi
  • IRAQUE: Mardan
    Dir: Batin Ghobadi
  • IRLANDA: The Gift
    Dir: Tommy Collins
  • ISLÂNDIA: Life in a Fishbowl
    Dir: Baldvin Zophoníasson
  • ISRAEL: Gett: The Trial of Viviane Amsalem
    Dir: Ronit Elkabetz, Shlomi Elkabetz
  • ITÁLIA: Human Capital
    Dir: Paolo Virzi
  • JAPÃO: The Light Shines Only There
    Dir: Mipo Oh
  • KOSOVO: Three Windows and a Hanging
    Dir: Isa Qosja
  • MACEDÔNIA: To the Hilt
    Dir: Stole Popov
  • LETÔNIA: Rocks in My Pockets
    Dir: Signe Baumane
  • LÍBANO: Ghadi
    Dir: Amin Dora
  • LITUÂNIA: The Gambler
    Dir: Ignas Jonynas
  • LUXEMBURGO: Never Die Young
    Dir: Pol Cruchten
  • MARROCOS: The Red Moon
    Dir: Hassan Benjelloun
  • MAURITÂNIA: Timbuktu
    Dir: Abderrahmane Sissako
  • MÉXICO: Cantinflas
    Dir: Sebastian del Amo
  • MOLDÁVIA: The Unsaved
    Dir: Igor Cobileanski
  • MONTENEGRO: The Boys from Marx and Engels Street
    Dir: Nikoa Vukcevic
  • NEPAL: Jhola
    Dir: Yadavkumar Bhattarai
  • NORUEGA: 1001 grams
    Dir: Bent Hamer
  • NOVA ZELÂNDIA: The Dead Lands
    Dir: Toa Fraser
  • PALESTINA: Eyes of a Thief
    Dir: Najwa Najjar
  • PANAMÁ: Invasion
    Dir: Abner Benaim
  • PAQUISTÃO: Dukhtar
    Dir: Afia Nathaniel
  • PERU: The Gospel of the Flesh
    Dir: Eduardo Mendoza de Echave
  • POLÔNIA: Ida
    Dir: Pawel Pawlikowski
  • PORTUGAL: E Agora? Lembra-me
    Dir: Joaquim Pinto
  • QUIRGUISTÃO: Kurmanjan Datka: Queen of the Mountains
    Dir: Sadyk Sher-Niyaz
  • REINO UNIDO: Little Happiness
    Dir: Nihat Seven
  • REPÚBLICA DOMINICANA: Cristo Rey
    Dir: Leticia Tonos
  • REPÚBLICA TCHECA: Fair Play
    Dir: Andrea Sedlackova
  • ROMÊNIA: The Japanese Dog
    Dir: Tudor Cristian Jurgiu
  • RÚSSIA: Leviatã (Leviathan)
    Dir: Andrey Zvyagintsev
  • SÉRVIA: See You in Montevideo
    Dir: Dragan Bjelogrlic
  • SINGAPURA: My Beloved Dearest
    Dir: Sanif Olek
  • SUÉCIA: Força Maior (Force Majeure)
    Dir: Ruben Ostlund
  • SUÍÇA: The Circle
    Dir: Stefan Haupt
  • TAILÂNDIA: Teacher’s Diary
    Dir: Nithiwat Tharathorn
  • TAIWAN: Ice Poison
    Dir: Midi Z
  • TURQUIA: Winter Sleep
    Dir: Nuri Bilge Ceylan
  • UCRÂNIA: The Guide
    Dir: Oles Sanin
  • URUGUAI: Mr. Kaplan
    Dir: Álvaro Brechner
  • VENEZUELA: Libertador
    Dir: Alberto Arvelo
Cena de Winter Sleep (photo by outnow.ch)

Um dos favoritos até o momento: o turco Winter Sleep, que venceu a Palma de Ouro 2014 (photo by outnow.ch)

Por enquanto, o turco Winter Sleep, que venceu a Palma de Ouro em Cannes este ano, larga na frente. Logo atrás, o canadense Mommy, que estava entre os indicados de Cannes, ganha notoriedade por seu jovem diretor Xavier Dolan, de 25 anos. Embora contenha elementos que afastam os votantes idosos da Academia como trilha musical bem pop com Dido e Counting Crows, a profundidade emocional extraída de seus atores pode ser um diferencial nesta disputa tão acirrada por uma vaga no Oscar. Existe ainda a possibilidade (mesmo que remota) da atriz de Mommy, Anne Dorval, participar de um burburinho na categoria de atriz. Também não é possível esquecer os irmãos belgas Dardenne. Embora Two Days, One Night não tenha conquistado prêmio algum em Cannes, ainda tem o poder de emocionar os votantes.

Anne Dorval em cena do canadense Mommy, de Xavier Dolan (photo by outnow.ch)

Anne Dorval em cena do canadense Mommy, de Xavier Dolan (photo by outnow.ch)

Entretanto, para alguns especialistas no gosto dos votantes do Oscar, o representante polonês tem ampla vantagem. Protagonizado por uma freira judia, Ida desenterra segredos do passado dela durante o Holocausto. Imagina se a maioria votante composta por judeus vai gostar?! Tudo que estiver relacionado à 2ª Guerra Mundial e/ou envolver judeus já contará com algum favoritismo. Prova disso é o último filme do Brasil a alcançar à semi-final: O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, que apresenta personagens da comunidade judaica em São Paulo. Sempre fui contra as regras da Academia em relação à esta categoria, pois praticamente limita os votos para idosos judeus, os únicos que conseguem assistir a todos os concorrentes em sessões vespertinas. Quando teremos um presidente da Academia que reformule tais regras arcaicas? Enfim, a Polônia tem sua chance de ouro, pois já foi indicada oito vezes ao Oscar de Filme Estrangeiro e nunca levou.

O polonês Ida, de Pawel Pawlikowski. Temática judia leva vantagem automática. (photo by outnow.ch)

O polonês Ida, de Pawel Pawlikowski. Temática judia leva vantagem automática. (photo by outnow.ch)

Outra nação que vive batendo na trave é o México, com as mesmas oito indicações. A última vez que concorreu foi em 2011 com Biutiful, de Alejandro González Iñárritu, que também já disputara com Amores Brutos em 2001. Este ano, o representante Cantiflas, de Sebastian del Amo, conta com o apoio da ótima bilheteria em solo americano de 6 milhões de dólares e por se tratar da vida do ator mexicano homônimo, que trabalhou ao lado de David Niven no clássico A Volta ao Mundo em Oitenta Dias, que faturou o Oscar de Melhor Filme em 1957.

Antes das indicações ao Oscar, haverá um corte para 9 semi-finalistas em janeiro. A 87ª cerimônia do Oscar acontecerá no dia 22 de fevereiro de 2015.

Tropa de Elite 2 está fora e o sonho do Oscar chega ao fim para o Brasil

Tropa de Elite 2: Oficialmente fora do Oscar 2012

Para aqueles que aguardavam ansiosamente uma indicação para Tropa de Elite 2 – O Inimigo Agora é Outro, sinto em informar que a Academia apagou a luz no fim desse túnel. Foi divulgada a lista com os 9 finalistas (feito conquistado pelo drama O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger em 2007) que se tornarão apenas 5 no dia 24 de janeiro, dia do anúncio das indicações ao Oscar. Segue a lista:

Bullhead, de Michael R. Roskam (Bélgica)

Footnote, de Joseph Cedar (Israel)

In Darkness, de Agnieszka Holland (Polônia)

Monsieur Lazhar, de Philippe Falardeau (Canadá)

Omar Killed Me, de Roschdy Zem (Marrocos)

Pina, de Wim Wenders (Alemanha)

A Separação, de Asghar Farhadi (Irã)

Superclásico, de Ole Christian Madsen (Dinamarca)

Warriors of the Rainbow: Seediq Bale, de Te-Sheng Wei (Taiwan)

Mas o tom negativo do post não se limita apenas à exclusão do filme de José Padilha. Infelizmente, a categoria de Melhor Filme Estrangeiro ainda apresenta algumas regras muito arcaicas que impossibilitam muitos filmes de qualidade de sequer competir.

O Tigre e o Dragão, de Ang Lee. Melhor Filme Estrangeiro de 2000.

Se tais regras fossem quebradas, certamente mais filmes poderiam competir e conquistar o público internacional como fizeram o taiwanês O Tigre e o Dragão e o alemão A Vida dos Outros, ambos vencedores do Oscar de Filme Estrangeiro e donos de uma arrecadação que ultrapassa os 100 milhões de dólares.

A Vida dos Outros, de Florian Henckel. Melhor Filme Estrangeiro de 2006.

Existe uma regra da Academia que obriga cada país participante a escolher apenas UM filme. Então, assim como é feito no Brasil, membros de uma comissão como o MinC (Ministério da Cultura) votam entre os filmes lançados em cada ano, o que nem sempre corresponde ao melhor filme do ano. Em 2002, por exemplo, Fale com Ela, de Pedro Almodóvar não foi selecionado pela comissão de seu país e a Espanha sequer figurou entre os indicados. Felizmente, como muitos artistas em Hollywood apreciam a obra do diretor, ele levou o Oscar de Roteiro Original naquela edição. Este ano, o esnobado pelo próprio país foi o francês O Artista, filme que já levou o Globo de Ouro e vários prêmios da crítica americana. Por esse motivo, não poderá concorrer a Melhor Filme Estrangeiro.

Outra regra ultrapassada que não corresponde ao cinema globalizado de hoje consiste na obrigação de empregar atores nascidos no país da origem do filme em papéis-chaves na trama (além de ter que falar o idioma local). Pela Albânia, o filme de Joshua Marston (diretor de Maria Cheia de Graça, 2004), Forgiveness foi desqualificado por não cumprir essa regra. Enquanto que o filme de Angelina Jolie, In the Land of Blood and Honey, não pôde concorrer por se tratar de uma produção americana, mesmo tendo empregrado atores da hoje extinta Iugoslávia.

Ainda falta outro grande absurdo. Ok, foram selecionados os 63 filmes do mundo este ano para tentar conquistar uma famigerada vaga na categoria. E agora? Quem vai poder votar nesses filmes e eliminar 58 trabalhos? Existe algo chamado Academy’s foreign-language selection committee (Comitê de Seleção de Filme Estrangeiro da Academia), composta por membros preparados para ficar com o traseiro quadrado de tanto assistir filmes. Eles são divididos em grupos de 4 cores e cada membro deve ver pelo menos 80% dos filmes de seu grupo. Mas, como todos sabem, quem consegue tempo pra assistir a tantos filmes? Sim, chamem membros já no conforto da aposentadoria que não querem mais ficar em casa vendo a mulher reclamar! A lotação dessas sessões de filmes estrangeiros deve se assemelhar àquelas que ocorrem em asilos em que as enfermeiras ligam pra sossegar os agitados. Cerca de 300 (heróicos) membros conseguem assistir a todos os filmes e votar numa escala de 7 a 10, criando uma média para a seleção, o que significa que se 10 ou 100 pessoas virem um filme, é a média desses 300 membros que conta.

“Hooray! Vou eliminar 58 filmes!”. Perdoem-me se imagino 300 Srs. Fredericksens na sala de cinema.

Resultado? Os finalistas sempre têm temas mais antigos. Eles adoram filmes que se passam na 2ª Guerra Mundial, com judeus sofrendo e nazistas cumprindo seus papéis de malvados, sem esquecer dos soldados americanos que sempre chegam pra salvar o dia. O segundo tema mais querido pelos membros velhinhos de Hollywood é a questão do racismo. Se seu filme tem conflitos raciais e se passa na Segunda Guerra, coloca pra competir! Mas lembre-se que não pode haver violência excessiva. Isso assusta os membros e pode causar uma taquicardia. Você acha que foi fácil um pobre membro assistir a Tropa de Elite 2? E Cidade de Deus com aquele lance de “você prefere um tiro no pé ou na mão?”? Cinema violento não tem lugar na categoria de Filme Estrangeiro. Por isso mesmo que o cinema sul-coreano nunca teve uma chance sequer, pois tem como característica muito marcante a violência e o sexo. Ah sim, o sexo é algo obsceno demais. Os membros cobrem seus olhos nas cenas mais picantes.

Mas voltando ao processo de eliminação de filmes, as 6 obras mais votadas pelos membros que assistiram aos filmes passam para uma shortlist, que inclui ainda mais 3 filmes selecionados por um comitê executivo de 20 pessoas. Atualmente, nesse super-comitê constam nomes consagrados do Cinema como o diretor alemão Florian Henckel von Donnersmarck, diretor de fotografia polonês do Spielberg, Janusz Kaminski, e o roteirista de O Jogador (1992), Michael Tolkin. Esse comitê pode não desfazer todas as injustiças da seleção dos membros idosos, mas evita maiores catástrofes.

Divulgada a lista de 9 finalistas, os filmes são projetados num final de semana para 20 votantes de Los Angeles e 10 de Nova York. Esses votantes são escolhidos pelo presidente do super-comitê, que visa uma votação mais completa pois procura por membros veteranos em diversas áreas do Cinema. No final, eles cortam 4 filmes, elegendo então os 5 indicados. E, para completar a burocracia: Só membros que comprovem que viram os 5 indicados no cinema (não, não pode ser em DVD e Blu-ray – tem que mostrar o ingresso!) podem votar no vencedor, ou seja, voltam os membros idosos que selecionaram anteriormente com suas escolhas arcaicas.

O Segredo de seus Olhos, de J.J. Campanella. Segundo e Merecido Oscar para Argentina.

Contudo, apesar de todos os problemas e a falta dessa reforma na legislação da Academia, não dá pra sair reclamando de tudo. Por incrível que pareça, o Oscar foi para alguns ótimos filmes nessa última década que me surpreenderam muito positivamente. Foram os casos das vitórias do belo argentino O Segredo de Seus Olhos, de Juan José Campanella, do instigante alemão A Vida dos Outros, de Florian Henckel von Donnersmarck, e do tocante japonês A Partida, de Yôjirô Takita.

Quanto ao Tropa de Elite 2 – O Inimigo Agora é Outro, houve alguns contratempos que atrapalharam um alcance maior na temporada de premiações, sendo uma delas a ausência no Globo de Ouro. Como o filme estreou no Brasil em outubro de 2011, não pôde concorrer porque as regras da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood exige que o filme tenha sua estréia a partir de novembro. Mas mesmo sem os grandes prêmios, o filme de José Padilha confirma o amadurecimento do nosso Cinema. A sequência apresenta um roteiro muito mais consistente e personagens mais fortes. A trama em si é muito corajosa por bater de frente com o velho problema da política no Brasil. Quem não queria estar na pele do Capitão Nascimento ao esbofetear um político corrupto?

Agora, com José Padilha assumindo o projeto de refilmagem do filme RoboCop, o Brasil fica órfão de mais um diretor competente pra tentar buscar a cobiçada estatueta do Oscar. Gostaria que Walter Salles e Fernando Meirelles, cujas carreiras internacionais não conseguiram deslanchar de vez, voltassem e fizessem um filme aqui pra manter essa frequência de qualidade anual.

No dia 8 de dezembro de 2011, Tropa de Elite 2 se tornou o filme mais visto da História do Cinema Brasileiro, quando atingiu a marca de 10.736.995 espectadores após nove semanas de exibição, ultrapassando a marca histórica de 1976, de Dona Flor e seus dois maridos, de Bruno Barreto.

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