Nagisa Ôshima (1932 – 2013)

Nagisa Ôshima em ação(photo by empireonline.com)

Nagisa Ôshima em ação
(photo by empireonline.com)

Quando fiquei sabendo da morte do diretor japonês Nagisa Ôshima nessa noite do dia 15 de janeiro, na hora me veio à cabeça aquela cena final de O Império dos Sentidos. Lançado em 1976, o polêmico filme trata de uma paixão obsessiva entre um homem e uma prostituta. Esse desejo é tão intenso e ardente que os hormônios parecem saltar da tela, chegando a causar uma ansiedade e mal estar. Ôshima cola a câmera em seus atores no ato sexual com esse propósito de aproximar o espectador. Ele busca transmitir esse desejo de forma que o público não fique indiferente a essa relação doentia.

Lembro de ter alugado esse filme, em VHS (!), quando tinha meus 20 anos, e mesmo uma década depois, partes dessa sensação incômoda ainda permanecem.

Clima caliente e obsessivo de O Império dos Sentidos, filme mais icônico de Nagisa Ôshima (photo by OutNow.CH)

Clima caliente e obsessivo de O Império dos Sentidos, filme mais icônico de Nagisa Ôshima (photo by OutNow.CH)

O Império dos Sentidos estreou no Festival de Cannes, porque o diretor pertencia ao prestigioso grupo conhecido como “Nuberu bagu” (a Nouvelle vague japonesa), que contava com Shôhei Imamura, Yoshishige Yoshida e Masahiro Shinoda. Mas, como todo filme que ultrapassa os limites da sociedade, sofreu nas mãos da censura do Japão, onde sua exibição foi proibida.

No Brasil, a história não foi diferente, ainda mais que o país estava sob forte censura entre as décadas de 70 e 80.  Curiosamente, O Império dos Sentidos só foi liberado por aqui nos anos 90, mas, humilhantemente, foi parar nas salas de cinema pornô no centro de São Paulo, desagradando o público de Arte e o público habitual do pornô, pois não se tratava de uma produção típica de prazer rotineiro.

Nagisa Ôshima se formou em Direito pela Universidade de Kyoto, mas migrou para o cinema, tornando-se assistente de direção na Companhia Shochiku. Contudo, inconformado com o sistema opressor dos estúdios, resolveu se rebelar e fundar sua própria produtora: Sozocha em 1965, possibilitando a realização de O Império dos Sentidos e outros filmes como O Império da Paixão (1978) e Furyo, Em Nome da Honra (1983), que tem em seu elenco um insinuante David Bowie. Furyo (Merry Christmas Mr. Lawrence) foi indicado à Palma de Ouro, venceu o BAFTA de Melhor Trilha Musical (Ryûichi Sakamoto) e Melhor Ator (Tom Conti) no National Board of Review.

Tom Conti e David Bowie em Furyo, em Nome da Honra.

Tom Conti e David Bowie em Furyo, em Nome da Honra. (photo by OutNow.CH)

Relacionamentos sexuais sempre estiveram presente na filmografia do Sr. Ôshima. Em 1986, ele dirigiu Max Mon Amour, no qual a protagonista (Charlotte Rampling) faz uma mulher francesa que troca o marido por um chimpanzé de zoológico para ser seu amante. Novamente foi indicado à Palma de Ouro em Cannes.

Seu último filme, Tabu (1999), coincidentemente, foi o primeiro filme que vi dele. Na trama, um complexo de treinamento de samurais na era Shogun passa a comportar uma série de conflitos internos quando entra em cena um jovem e belo samurai. O mestre (Takeshi Kitano) deve decidir se intervém na questão para trazer harmonia de volta ao seu complexo.

O samurai andrógino se defende de um "ataque noturno" em Tabu (photo by http://jfilmpowwow.blogspot.com.br)

O samurai andrógino se defende de um “ataque noturno” em Tabu (photo by jfilmpowwow.blogspot.com.br)

O cinema japonês (que o censurou) e o cinema mundial devem muito a Nagisa Ôshima. Graças a sua coragem e ousadia, o cinema como Arte se expandiu nos temas sexuais, polêmicos e humanos. O diretor e roteirista buscava entender a natureza humana e, ao mesmo tempo, aprimorar novos meios cinematográficos de captar histórias mais intimistas.

Nagisa Ôshima nos abandona aos 80 anos, mas seus filmes permanecem em nossas memórias e como inspiração para novos cineastas.