NOVE FILMES AVANÇAM para o OSCAR de FILME EM LÍNGUA ESTRANGEIRA. Mais uma vez, BRASIL não se classifica

 

 

EXCLUSÃO MAIS SENTIDA É A DO FRANCÊS 120 BATIMENTOS POR MINUTO

A Academia revelou os nove filmes que se classificaram para a lista prévia que disputará as cinco vagas na categoria de Filme em Língua Estrangeira. Lembrando que houve novo recorde este ano com 92 produções internacionais inscritas.

Pra quem não conhece o sistema de votação, os votantes que comprovaram que viram TODOS os 92 filmes (na grande maioria, idosos que têm o tempo livre pra isso) elegem seis semi-finalistas, enquanto um comitê especial  formado por vinte pessoas elege os outros três. Esse comitê foi criado depois que filmes relevantes como o romeno 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias, de Cristian Mungiu, e o mexicano Luz Silenciosa, de Carlos Reygadas, ficaram de fora da seleção do Oscar de 2008, causando revolta entre cinéfilos e cineastas. Normalmente, esses três filmes foram bem no circuito internacional de festivais e tem uma temática mais ousada.

Seguem os nove semi-finalistas, sendo os assinalados em vermelho minhas deduções da escolha do comitê:

UMA MULHER FANTÁSTICA (UNA MUJER FANTÁSTICA)
Dir: Sebastián Lelio – CHILE

EM PEDAÇOS (IN THE FADE)
Dir: Fatih Akin – ALEMANHA

ON BODY AND SOUL
Dir: Ildikó Enyedi – HUNGRIA

FOXTROT
Dir: Samuel Maoz – ISRAEL

THE INSULT
Dir: Ziad Doueiri – LÍBANO

LOVELESS
Dir: Andrey Zvyagintsev – RÚSSIA

FÉLICITÉ
Dir: Alain Gomis – SENEGAL

THE WOUND
Dir: John Trengove – ÁFRICA DO SUL

THE SQUARE
Dir: Ruben Östlund – SUÉCIA

JUSTIFICATIVAS

Apesar das mudanças recorrentes na Academia, principalmente com a inclusão de vários membros internacionais novos, a categoria de Filme em Língua Estrangeira ainda pena demais para eleger as melhores produções do ano. Já comentei aqui e ainda insisto: deveriam elevar o número de indicados para dez filmes, sendo cinco escolhidos pelos votantes idosos, e cinco pelo comitê, porque se depender apenas dos votantes idosos, teríamos apenas filmes de temática religiosa, preferencialmente com cenário da Segunda Guerra Mundial, campos de concentração, Holocausto e sofrimento em geral.

UMA MULHER FANTÁSTICA. O representante chileno tem como protagonista uma transsexual, interpretada por Daniela Vega. Quando seu namorado mais velho morre, ela precisa enfrentar o preconceito da família dele a fim de sofrer luto como uma mulher. Como todos sabem, pessoas idosas e mais conservadoras têm aversão a qualquer coisa relacionada à sexualidade, principalmente se for LGBT. Ponto pro comitê especial.

LOVELESS. O representante russo pode já ter sido indicado ao Oscar em 2015 com o ótimo drama social Leviatã, mas seu novo filme não parece destinado aos conservadores. Loveless tem uma sinopse normal: o desaparecimento de um menino em meio às brigas de seus pais , porém ele é pesado, denso e com desdobramentos que fazem o espectador pensar sobre aborto, individualidade e imaturidade. Seu formato e ritmo não é dos que costuma agradar os velhinhos. Ponto pro comitê especial.

THE SQUARE. Além de vencer a Palma de Ouro em Cannes, sob a batuta do presidente do júri, Pedro Almodóvar, o representante sueco tem comédia de humor negro em sua receita, algo não muito bem digerido por conservadores, que podem não entender a piada. O comitê certamente levou a carreira internacional bem-sucedida do filme em conta, além da frustração do diretor Ruben Ostlund quando soube que seu filme anterior, Força Maior, não havia sido indicado ao Oscar (segue link do vídeo):

EXCLUÍDOS NOTÓRIOS

120 Batimentos Por Minuto (França)

Dessas três seleções do comitê, se fossem quatro, certamente o filme de Robin Campillo estaria entre os nove. A produção que trata do movimento ativista que pede ajuda do governo e da indústria farmacêutica para combater a epidemia do vírus da Aids nos anos 90 vinha colecionando prêmios (como o Grande Prêmio do Júri em Cannes e os prêmios de Filme Estrangeiro no LAFCA e NYFCC) e indicações relevantes como no Critics’ Choice Awards. Se este filme sobre o universo LGBT não pode participar do Oscar, espera-se que Me Chame Pelo Seu Nome possa vingar nas categorias principais.

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EXCLUÍDO: 120 Batimentos Por Minuto, de Robin Campillo

First They Killed My Father (Camboja)

O representante do Camboja tinha como maior trunfo Angelina Jolie. Em sua quarta incursão como diretora, ela optou por recontar os horrores vividos por uma ativista de direitos humanos quando o país era dominado pelo regime do Khmer Vermelho. Como o mundo inteiro já sabe, Jolie tem forte apelo humanista através de suas ações como ativista, e esse filme consegue unir suas duas paixões. Honestamente, acreditava que sua indicação nesta categoria seria garantida, inclusive pensando numa possível indicação na categoria de Direção. Mas pelo visto, a produção da Netflix não agradou os votantes, mesmo havendo muito sofrimento na tela.

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EXCLUÍDO: First They Killed my Father, de Angelina Jolie

Bingo: O Rei das Manhãs (Brasil)

Faltou uma carreira internacional para o filme de estréia de Daniel Rezende. Apesar do personagem Bozo ser americano e internacional, faltou presença mais marcante em festivais ao redor do mundo que pudesse proporcionar maior notoriedade. O último indicado brasileiro ao Oscar, Central do Brasil, venceu o Urso de Ouro no festival alemão de Berlim. Aí fica a pergunta: Se Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky, tivesse sido selecionado, o Brasil estaria nessa lista pelo menos? Nunca saberemos! O último filme brasileiro que conseguiu passar para esta pré-lista foi O Ano em que meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger, em 2007. Também faz tempo…

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EXCLUÍDO: Bingo: O Rei das Manhãs, de Daniel Rezende

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Os cinco filmes indicados serão revelados no dia 23 de janeiro.

Comissão seleciona ‘BINGO: O REI DAS MANHÃS’ para representar o BRASIL no OSCAR 2018

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Vladimir Brichta como Bozo, ou melhor, Bingo (pic by Veja Rio)

FILME SOBRE PALHAÇO AMERICANO CONCORRERÁ A UMA DAS CINCO VAGAS NA CATEGORIA DE FILME EM LÍNGUA ESTRANGEIRA

Na manhã desta sexta-feira, na Cinemateca aqui em São Paulo, a Comissão da Academia Brasileira de Cinema (ABC) anunciou a seleção de Bingo: O Rei das Manhãs como representante do país no Oscar 2018. O filme do diretor estreante Daniel Rezende (conhecido como o montador de Cidade de Deus) bateu outros 22 concorrentes listados abaixo. Importante ressaltar que 23 inscritos é o número recorde do cinema nacional. Ano passado, foram 16 filmes.

  • A Família Dionti
    Dir: Alan Minas
  • A Glória e a Graça
    Dir: Flávio Ramos Tambellini
  • Café – Um Dedo de Prosa
    Dir: Maurício Squarisi
  • Cidades Fantasmas
    Dir: Tyrell Spencer
  • Como Nossos Pais
    Dir: Laís Bodanzky
  • Corpo Elétrico
    Dir: Marcelo Caetano
  • Divinas Divas
    Dir: Leandra Leal
  • Elis
    Dir: Hugo Prata
  • Era o Hotel Cambridge
    Dir: Eliane Caffé
  • Fala Comigo
    Dir: Felipe Sholl
  • O Filme da Minha Vida
    Dir: Selton Mello
  • Gabriel e a Montanha
    Dir: Fellipe Barbosa
  • História Antes da História
    Dir: Wilson Lazaretti
  • Joaquim
    Dir: Marcelo Gomes
  • João, o Maestro
    Dir: Mauro Lima
  • La Vingança
    Dir: Fernando Fraiha e Jiddu Pinheiro
  • Malasartes e o Duelo com a Morte
    Dir: Paulo Morelli
  • Polícia Federal – A Lei é Para Todos
    Dir: Marcelo Antunez
  • Por trás do Céu
    Dir: Caio Sóh
  • Quem é Primavera das Neves
    Dir: Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado
  • Real – O Plano por trás da História
    Dir: Rodrigo Bittencourt
  • Vazante
    Dir: Daniela Thomas

CURIOSIDADE DOS BASTIDORES

Este ano, a seleção do representante foi feita pela primeira vez pela Academia de Cinema Brasileiro, devido a uma polêmica em 2016, quando a Secretaria do Audiovisual decidiu eleger o drama pouco conhecido Pequeno Segredo, de David Schürman, quando claramente a produção que tinha mais chances era Aquarius, de Kléber Mendonça Filho, que além de contar com Sonia Braga como protagonista, havia sido indicado à Palma de Ouro em Cannes.

Na época, a Secretaria do Audiovisual declarou que Pequeno Segredo tinha “elementos universais” que favoreciam sua seleção, mas esse argumento não colou muito, porque a diferença da projeção internacional em relação a Aquarius era no mínimo colossal. O motivo real de sua desclassificação, como muitos já sabem, foi o protesto no tapete vermelho de Cannes contra o governo de Michel Temer.

Cheguei a escrever um post logo depois desse protesto, e ainda hoje não vejo lado certo nessa história. Apesar de ser defensor da liberdade de expressão, achei desnecessário o protesto em Cannes porque não se tratava de um evento político e além disso, a verba para o filme veio do governo. Por outro lado, claro que é ridículo um governo articular uma desclassificação de um filme só por causa de um protesto! E no final, o grande perdedor dessa história é o cinema brasileiro, são os profissionais que fazem cinema e o próprio público, que perdeu a chance de ver seu país novamente representado no Oscar desde 1999, quando Central do Brasil concorreu.

A DISPUTA

Existia forte possibilidade do escolhido deste ano estar entre os dramas Como Nossos Pais e O Filme da Minha Vida. O primeiro, dirigido pela competente Laís Bodanzky de Bicho de Sete Cabeças, tem um quê de drama familiar argentino, com bons diálogos e atuações. De alguma forma, ele lembra o clima familiar meio conturbado do vencedor do Oscar, Invasões Bárbaras, de Denys Arcand.

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Cena de Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky (pic by carta capital)

Já o segundo, terceiro longa dirigido pelo ator Selton Mello, tinha a seu favor a retratação de época, a fotografia de Walter Carvalho e alguma internacionalidade trazida pelo ator francês Vincent Cassel, e o escritor chileno Antonio Skármeta (responsável pelo sucesso de O Carteiro e o Poeta) cujo trabalho originou o roteiro.

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Cena com Selton Mello e Johnny Massaro em O Filme da Minha Vida (pic by abril.com.br)

Contudo, a Comissão optou pelo filme Bingo: O Rei das Manhãs, uma espécie de comédia biográfica de humor negro, o que à princípio parece uma escolha ousada demais para o Oscar. Parece.

Embora se trate da história de um ator que interpreta um palhaço num programa infantil e que abusa das drogas e sexo, existem elementos que podem ajudar na campanha do Oscar. Primeiramente, o nome do diretor Daniel Rezende. A Academia pode errar muitas vezes, mas ela costuma ter boa memória. Artistas previamente indicados têm melhores chances em relação aos demais, e Rezende foi indicado ao Oscar de Montagem por Cidade de Deus em 2004. Perdeu MUITO injustamente para a montagem longa e cansativa de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei.

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À direita, Daniel Rezende passa instruções para os atores Leandra Leal e Vladimir Brichta para a cena da premiação (pic by Judão)

Para quem não conhece, Bingo é o nome fictício usado para substituir Bozo, o palhaço que comandava o programa infantil que passava todas as manhãs no SBT, mais especificamente focado na vida do intérprete Arlindo Barreto. Como o roteiro tinha sexo, drogas e o palavreado, os detentores dos direitos não permitiram o uso dos nomes reais, obrigando o roteirista Luiz Bolognesi e a equipe a contornar a situação com outros nomes e alterar caracterização de personagens. Mas mesmo assim, é impossível não identificar Bozo, que é de origem americana, o que o tornará conhecido para o público americano e para os votantes do Oscar.

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Para os saudosistas: Bozo e Vovó Mafalda no programa infantil (pic by uol.com.br)

E o terceiro elemento que pode ajudar Bingo é justamente o momento em que vive a Academia. Apesar de eu ainda achar que eles sempre vão dar preferência aos filmes sobre Holocausto e cultura judaica, percebo que eles estão tentando mudar esse cenário. Nos últimos anos, premiaram longas de países que saem daquela panelinha européia Itália-França-Holanda-Espanha, e indicaram alguns países pela primeira vez na história como O Lobo do Deserto (da Jordânia), Timbuktu (da Mauritânia), Tangerinas (da Estônia) e A Imagem que Falta (do Camboja).

COMPETIÇÃO ATÉ O MOMENTO

Como a lista oficial dos filmes selecionados para a categoria ainda está longe de estar completa, vou deixar pra postá-la depois. Por enquanto, são 47 países que definiram seus representantes de um total que deve ultrapassar a estimativa de mais de 80.

Até o momento, os mais fortes concorrentes selecionados são:
* Os 4 em negrito já largam na frente

Áustria: Happy End, de Michael Haneke
Chile: Uma Mulher Fantástica, de Sebastián Lelio
Finlândia: Tom of Finland, de Dome Karukoski
Alemanha: In the Fade, de Fatih Akin
Japão: Her Love Boils Bathwater, de Ryota Nakano
Líbano: The Insult, de Ziad Doueiri
Suécia: The Square, de Ruben Östlund

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Cena do chileno Uma Mulher Fantástica, de Sebastián Lelio, em cartaz em São Paulo (pic by moviepilot.de)

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Haverá uma pré-seleção em dezembro que definirá 9 filmes e somente no dia 23 de janeiro, os cinco indicados serão conhecidos.