‘O Lado Bom da Vida’ domina o Independent Spirit Awards 2013

David O. Russell, vencedor de Melhor Diretor e Roteiro por O Lado Bom da Vida, no Independent Spirit Awards

David O. Russell, vencedor de Melhor Diretor e Roteiro por O Lado Bom da Vida, no Independent Spirit Awards (photo by latimes.com)

Um dia antes de concorrer em oito categorias no Oscar, a comédia O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook) se tornou a grande vitoriosa do prêmio que prestigia o cinema mais independente. Além de Melhor Filme, o filme de David O. Russell levou Direção, Roteiro e Atriz para Jennifer Lawrence.

Curiosamente, o orçamento de produção do vencedor ultrapassa em 1 milhão de dólares do limite estipulado pela premiação para poder concorrer, mas parece que o lobby da distribuidora Weinstein Company falou mais alto. Aliás, esta é a segunda produção consecutiva da Weinstein a ganhar o Independent Spirit Awards depois de O Artista.

Jennifer Lawrence aceitando prêmio de Melhor Atriz por O Lado Bom da Vida (photo by movies.yahoo.com)

Jennifer Lawrence aceitando prêmio de Melhor Atriz por O Lado Bom da Vida (photo by movies.yahoo.com)

Em 2012, havia uma discussão sobre a eligibilidade de O Artista nas principais categorias. Como ambos os atores principais (Jean Dujardin e Bérènice Bejo) e o diretor Michel Hazanavicius são franceses, o filme deveria ter competido apenas como produção estrangeira. Acabou também limpando a premiação com Melhor Filme, Diretor, Fotografia e Ator.

Com o domínio de O Lado Bom da Vida, um dos principais concorrentes ficou praticamente esquecido: Indomável Sonhadora. Apesar de terem tentado compensar o pequeno filme apenas com o prêmio de Fotografia para Ben Richardson, o público ficou com a sensação de injustiça, afinal, terá poucas chances nas quatro categorias que está indicado no Oscar ao contrário do filme vencedor.

Pelo histórico do Independent Spirit Awards, surgiu uma famosa frase: “Ganhe no sábado e perca no domingo”. Normalmente o filme vencedor perde no Oscar no dia seguinte. Casos mais recentes incluem Cisne Negro, Preciosa – Uma História de Esperança e O Lutador. O único a quebrar esta escrita foi justamente O Artista, que levou ambos o Independent e o Oscar.

Contudo, essa aliança tende a ficar mais recorrente. Desde 2000, 10 dos 13 vencedores de Melhor Filme foram também indicados a Melhor Filme no Oscar. Sem contar os atores que ganharam os dois prêmios: Jean Dujardin (O Artista), Christopher Plummer (Toda Forma de Amor), Natalie Portman (Cisne Negro), Mo’Nique (Preciosa – Uma História de Esperança) e Jeff Bridges (Coração Louco).

Ainda sobre os vencedores nas categorias de atuação, o Independent Spirit Awards salvou o ano dos atores John Hawkes e Matthew McConaughey. Ambos tiveram suas interpretações muito elogiadas pela crítica no final de 2012, mas viram suas boas campanhas naufragarem com a ausência na lista do Oscar. Em seu discurso de agradecimento, McConaughey, que venceu pelo papel de um dono de clube de striptease em Magic Mike, soltou um desabafo: “Tive que tirar minhas calças pra ganhar um troféu!”. E com a ausência da favorita Anne Hathaway, Helen Hunt acabou levando a melhor na categoria de atriz coadjuvante por As Sessões.

John Hawkes recebe prêmio de Melhor Ator por As Sessões das mãos de Salma Hayek (photo by sfgate.com)

John Hawkes recebe prêmio de Melhor Ator por As Sessões das mãos de Salma Hayek (photo by sfgate.com)

Amor, de Michael Haneke, confirmou seu favoritismo e deve chegar com força total para o Oscar, mesmo que seus concorrentes diretos (o chileno No e o norueguês Expedição Kon-Tiki) não tenham sido sequer indicados ao Independent Spirit.

Acompanhe novamente os indicados e os vencedores (assinalados em negrito):

MELHOR FILME
Indomável Sonhadora (Beasts of the Southern Wild)
Bernie
Deixe a Luz Acesa (Keep the Lights On)
Moonrise Kingdom (Moonrise Kingdom)
• O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook)

MELHOR DIRETOR
Wes Anderson, Moonrise Kingdom
Julia Loktev, The Loneliest Planet
• David O. Russell, O Lado Bom da Vida
Ira Sachs, Deixe a Luz Acesa
Benh Zeitlin, Indomável Sonhadora

MELHOR ROTEIRO
Wes Anderson & Roman Coppola, Moonrise Kingdom
Zoe Kazan, Ruby Sparks – A Namorada Perfeita
Martin McDonagh, Sete Psicopatas e um Shih Tzu
• David O. Russell, O Lado Bom da Vida
Ira Sachs, Deixe a Luz Acesa

MELHOR FILME DE ESTREANTE
Fill the Void
Gimme the Loot
Sem Segurança Nenhuma (Safety Not Guaranteed)
Sound of My Voice
• As Vantagens de Ser Invisível (The Perks of Being a Wallflower)

MELHOR ROTEIRO DE ESTREANTE
Rama Burshtein, Fill the Void
• Derek Connolly, Sem Segurança Nenhuma
Christopher Ford, Frank e o Robô
Rashida Jones & Will McCormack, Celeste e Jesse Para Sempre
Jonathan Lisecki, Gayby

JOHN CASSAVETES AWARD – (para produções abaixo de 500 mil dólares)
Breakfast with Curtis
• Middle of Nowhere
Mosquita y Mari
Starlet
The Color Wheel

MELHOR ATRIZ
Linda Cardellini, Return
Emayatzy Corinealdi, Middle of Nowhere
• Jennifer Lawrence, O Lado Bom da Vida
Quvenzhané Wallis, Indomável Sonhadora
Mary Elizabeth Winstead, Smashed

MELHOR ATOR
Jack Black, Bernie
Bradley Cooper, O Lado Bom da Vida
• John Hawkes, As Sessões
Thure Lindhardt, Deixe a Luz Acesa
Matthew McConaughey, Killer Joe – Matador de Aluguel
Wendell Pierce, Four

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Rosemarie DeWitt, Your Sister’s Sister
Ann Dowd, Compliance
• Helen Hunt, As Sessões
Brit Marling, Sound of My Voice
Lorraine Toussaint, Middle of Nowhere

MELHOR ATOR COADJUVANTE
• Matthew McConaughey, Magic Mike
David Oyelowo, Middle of Nowhere
Michael Péna, Marcados Para Morrer
Sam Rockwell, Sete Psicopatas e um Shih Tzu
Bruce Willis, Moonrise Kingdom

MELHOR FOTOGRAFIA
Yoni Brook, Valley of Saints
Lol Crawley, Here
• Ben Richardson, Indomável Sonhadora
Roman Vasyanov, Marcados Para Morrer
Robert Yeoman, Moonrise Kingdom

MELHOR DOCUMENTÁRIO
How to Survive a Plague
Marina Abramović: The Artist is Present
The Central Park Five
• The Invisible War
The Waiting Room

MELHOR FILME INTERNACIONAL
Amor (França) de Michael Haneke
Once Upon A Time in Anatolia (Turquia), de Nuri Bilge Ceylan
Ferrugem e Osso (França/Bélgica), de Jacques Audiard
Sister (Suíça), de Ursula Meier
A Feiticeira da Guerra (República Democrática do Congo), de Kim Nguyen

PIAGET PRODUCERS AWARD
Nobody Walks, Alicia Van Couvering
Prince Avalanche, Derrick Tseng
Stones in the Sun, Mynette Louie

SOMEONE TO WATCH AWARD
Pincus, diretor David Fenster
Gimme the Loot, diretor Adam Leon
Electrick Children, diretora Rebecca Thomas

TRUER THAN FICTION AWARD (dado para documentaristas emergentes)
Leviathan, diretores Lucien Castaing-Taylor and Véréna Paravel
The Waiting Room, diretor Peter Nicks
Only the Young, diretores Jason Tippet & Elizabeth Mims

ROBERT ALTMAN AWARD (pelo elenco)
Starlet
Diretor: Sean Baker
Diretor de Casting: Julia Kim
Elenco: Dree Hemingway, Besedka Johnson, Karren Karagulian, Stella Maeve, James Ransone.

FIND Your Audience Award
Breakfast With Curtis, de Laura Colella
The History of Future Folk, de John Mitchell, Jeremy Kipp Walker

Matthew McConaughey com o prêmio de coadjuvante por Magic Mike (photo by beaumontenterprise.com)

Matthew McConaughey com o prêmio de coadjuvante por Magic Mike (photo by beaumontenterprise.com)

Tudo Pelo Poder (The Ides of March), de George Clooney (2011)

Tudo Pelo Poder

EM SEU 4º FILME, CLOONEY BUSCA OBSERVAR A NATUREZA HUMANA NUMA CAMPANHA ELEITORAL

Tudo Pelo Poder poderia ser mais um drama político chato e clichê, com aquela mensagem moralista que normalmente marca esse gênero, pois conta a trajetória da campanha de um governador rumo à presidência com alguns escândalos políticos a varrer para debaixo do tapete. Até o pôster (acima) parece dizer isso! Contudo, nas mãos de George Clooney, tornou-se um filme honesto, leve e eficiente.

Assim como outros atores que assumiram a cadeira de diretor, como Robert Redford e Clint Eastwood, George Clooney procura repassar seu conhecimento de direção de atores em cada filme seu. E olha que ele já trabalhou com profissionais consagrados como Steven Soderbergh, os irmãos Coen e Terrence Malick. Por esse motivo, o trabalho de atuação é a melhor qualidade deste novo filme. Ryan Gosling, Evan Rachel Wood, o próprio Clooney, Phillip Seymour Hoffman, Paul Giamatti, Jeffrey Wright e Marisa Tomei formam um conjunto tão consistente que seguram a barra quando a trama ainda está esquentando.

Particularmente, Ryan Gosling e Evan Rachel Wood apresentam as melhores performances. Enquanto ele está em plena ascensão (em 2011, estrelou também Drive e a comédia romântica Amor à Toda Prova, pelo qual também foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Ator – Comédia ou Musical), Evan está em processo de amadurecimento (desde o drama Aos Treze, de 2003, até 2008, quando atuou ao lado de Mickey Rourke em O Lutador).

Apesar do filme girar em torno do candidato do partido democrata, o longa acompanha o trabalho do coordenador da campanha Stephen Meyers, vivido por Ryan Gosling, que se envolve num polêmico encontro com o coordenador

Clinton e Lewinski: Sexo oral na mídia

do partido republicano (Paul Giamatti)e, em seguida, uma “escapadela” do governador com uma estagiária (Evan Rachel Wood). Quando vi o trailer e li a sinopse, pensei que o filme se tratava de uma reprodução do polêmico affair do então presidente americano Bill Clinton com a estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky, nos anos 90. Mas  a história era outra. Além de se passar na época da candidatura, o filme troca o sexo oral inofensivo por uma gravidez. E pelo menos Evan Rachel Wood é bem mais atraente que a rechonchudinha sem graça Lewinsky.

Mas George Clooney não está necessariamente interessado em resgatar casos antigos simplesmente para contar uma boa história. A mensagem desse filme parece refletir uma insatisfação pública cada vez mais forte nos EUA em relação ao atual presidente Barack Obama. Boa parte da população parece culpá-lo por essa crise que assola o país, ignorando o fato de Obama ter assumido o controle de um barco furado deixado por George W. Bush. Para quem acompanhou sua candidatura em 2008, cansou de ver os pôsteres estilizados com o rosto de Obama e ouvir os dizeres “Yes, we can”. E George Clooney se aproveita disso e cria um pôster semelhante para seu personagem Mike Morris com o intuito de fazer essa ponte de sua trama com a realidade.

Morris/Obama: alguma semelhança?

Mesmo se tratando de um filme com teor político, Clooney usa o cenário de campanha eleitoral como pano de fundo para criticar os efeitos desgastantes da natureza das novas mídias políticas em seus personagens, que vivem sob pressão do início ao fim. No final dessa maratona, o espectador se pergunta se um candidato consegue permanecer fiel a seus valores até chegar à presidência, pois há uma batalha constante de interesses, onde todos são mascarados.

E os cuidados da direção de Clooney não páram por aí. Ele busca meios concisos de transpôr seu roteiro do papel para a película. Duas cenas em particular me chamaram a atenção. Na primeira ocorre uma demissão. Ela dura cerca de 1 minuto e se passa dentro de um automóvel, mas não vemos nada no interior. O que vemos é um personagem entrando no veículo e ao fim, saindo. Não há diálogo, nem trilha, mas diz tudo. E a segunda, ocorre durante uma conferência de imprensa e um toque de celular que a interrompe. Mais uma vez sem diálogo. É esse tipo de cena que vejo em falta em alguns filmes americanos de hoje, inclusive em bons diretores como Christopher Nolan, que parece não dispensar nem uma linha sequer de diálogo de seus roteiros.

Tudo Pelo Poder concorreu ao Leão de Ouro no último Festival de Veneza e agora, voltou às colunas graças às suas 4 indicações ao Globo de Ouro: Melhor Filme – Drama, Melhor Ator – Drama (Ryan Gosling), Melhor Diretor (George Clooney) e Melhor Roteiro (George Clooney, Grant Heslov e Beau Willimon). Apesar de não acreditar em nenhuma vitória para o filme, talvez a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood resolva premiar George Clooney em uma categoria por ele ser uma figura muito querida com os repórteres (sim, com os homens também).